O Estado de S. Paulo, n. 46656, 14/07/2021. Política, p. A4

Análise: Limites ao fura-teto

Cláudio Couto


Em tempos de notícias ruins e da ameaça de decisões legislativas desastrosas (como o malfadado “Distritão”), ao menos uma ótima decisão foi produzida pela Câmara dos Deputados: a aprovação do projeto que limita os penduricalhos que dão, a um estamento burocrático (senão oligárquico) dos agentes públicos, ganhos tão ilegais como imorais.

É bem sabido que certos servidores, em especial juízes, são vezeiros em acumular vencimentos muito acima do que a lei determina, com a anuência dos tribunais. Tal sangria dos cofres públicos torna a sociedade patrocinadora involuntária de privilégios odiosos e antirrepublicanos, maldisfarçados por justificativas que são, elas mesmas, amparadas em aberrações – como as famigeradas férias de 60 dias dos magistrados, que as vendem.

Essa ignomínia sobrevivia não só pela complacência dos que a autorizavam e julgavam (frequentemente os mesmos), mas também pela fragilidade da legislação, que não explicitava cabalmente o que seria ou não permitido em termos de remuneração.

Ademais, a resistência corporativa de segmentos muito poderosos do funcionalismo dificultava iniciativas que possibilitassem estancar uma sangria não apenas fiscal, mas de equidade. A necessidade dos legisladores e do governo de mostrar serviço na contenção dos gastos públicos e um conflito distributivo severo, decorrente dos limites legais para o gasto governamental, foram os fatores fundamentais que viabilizaram essa decisão.

Cientista Político na FGV EAESP, Coordenador do Mestrado Profissional em Gestão e Políticas Públicas (MPGPP) e Produtor do Canal/Podcast “Fora da Política Não há Salvação”