O Globo, n. 32767, 24/04/2023. Opinião, p. 2

Senado tem missão de aperfeiçoar projeto sobre lobby



Faz 39 anos que o então senador Marco Maciel protocolou a primeira proposta para regular o lobby, de modo a dar maior transparência à defesa de interesses de toda sorte diante de políticos e governantes brasileiros. Desde então houve pelo menos 15 outros projetos, até a aprovação de um Projeto de Lei pela Câmara em novembro passado.

O Senado precisa aproveitar a oportunidade para fazer os ajustes necessários no texto e dotar o Brasil de uma lei capaz de tirar das sombras a atividade, legalizada em pelo menos 40 países, entre eles Estados Unidos, Chile, Alemanha e Austrália. Não se deve perder a chance de estabelecer normas de transparência para regular uma profissão que deveria ter o mesmo status de qualquer outra — e não pode ser confundida com a advocacia administrativa, praticada à margem da lei.

De acordo com o projeto, o lobista terá de ser registrado na Câmara, no Senado e em qualquer instituição pública onde queira atuar. Será proibido de oferecer bens e vantagens a qualquer agente público, exceto itens de baixo valor ou despesas com transporte, alimentação e hospedagem para cursos e eventos, pagas diretamente ao prestador do serviço, e não ao agente público, definidas como “hospitalidade legítima”. Quanto a punições, o servidor público pode ser exonerado, e o lobista suspenso ou multado.

Há também a preocupação de conceder tratamento igualitário a representantes dos diversos interesses existentes em torno de alguma medida a ser tomada no Executivo ou Legislativo. Faltam, porém, normas mais concretas para assegurar esse equilíbrio. De acordo com o advogado Flavio Britto, seria possível obrigar, como no Chile, que sejam ouvidos defensores de interesses e posições antagônicos.

Vários outros ajustes são necessários para que o projeto surta o efeito desejado. Falta estabelecer limites objetivos de valor para brindes e para a “hospitalidade legítima”. É preciso que seja compulsória a divulgação prévia da audiência de políticos e governantes com lobistas, informando data, hora e local do encontro. Também é necessário que todas as autoridades com poder de decisão sejam enquadradas na regra que obriga a publicar suas agendas com lobistas e determinar a antecedência exigida. O ideal é a divulgação desses encontros ser a mais ampla possível. O texto, por enquanto, prevê que as informações estejam apenas no Sistema Eletrônico de Agendas do Poder Executivo (e-Agendas).

Nos Estados Unidos, primeiro país a regulamentar o lobby, há proibição vitalícia a quem é ou foi membro do Congresso de ser lobista. E, para que um profissional possa ser contratado por algum membro do Legislativo, ele precisa cumprir uma quarentena de seis anos. Nada parecido foi incluído no texto aprovado na Câmara.

Relator do projeto no Senado, Izalci Lucas (PSDB-DF) concorda com a necessidade de aprimoramento do projeto. Para isso, convocará audiências públicas com participação de 13 instituições que debatem a questão do lobby, além de representantes de estados e municípios. “A ideia é fazer um projeto que seja realmente nacional”, diz ele. Espera-se que o Senado inicie quanto antes as audiências. A sociedade tem o direito a conhecer todos os interesses que se movem nos bastidores do poder. A nova lei fortalecerá a democracia e contribuirá para tirar o estigma da palavra lobby.