O Estado de S. Paulo, n. 46655, 13/07/2021. Metrópole, p. A10

Fogo avança em Bonito e no Pantanal; chuva deve ficar 50% abaixo da média

José Maria Tomazela 


Desde a semana passada, focos de incêndio têm se espalhado por áreas turísticas de Mato Grosso do Sul. Só entre a tarde de anteontem e a de ontem, o fogo consumiu área de 800 hectares, equivalente a mil campos de futebol, entre as cidades de Jardim e Bonito, um dos mais importantes centros de ecoturismo do País. Na região de Corumbá, as chamas também ameaçam fauna e flora do Pantanal. A previsão para os meses de julho a setembro é ter entre 40% e 50% menos chuva do que o esperado para a época, segundo o governo estadual.

Na tarde de ontem, os principais focos de fogo tinham sido apagados, disse o comandante dos Bombeiros, coronel Hugo Djan Leite. Mas ainda havia fumaça, indicando a possibilidade da volta das chamas. O risco é de que o fogo atinja o Parque Nacional da Serra da Bodoquena, que concentra porções de Cerrado e Mata Atlântica.

Os bombeiros faziam o rescaldo da área e recolhiam animais acuados ou feridos. Um filhote de cervo foi removido da área incendiada. Anteontem, os bombeiros já haviam se deparado com uma sucuri de 5,5 metros e 80 quilos, atingida e morta pelo fogo. Segundo o Corpo de Bombeiros local, desde a última quinta-feira foram queimados 3,8 mil hectares de vegetação nativa.

Nos dez primeiros dias deste mês, foram detectados 270 focos de incêndio no Pantanal de Mato Grosso do Sul, segundo o Instituto SOS Pantanal. "O número indica que a temporada de incêndios já está em curso e o alerta é máximo. Porém, apesar de termos um inverno mais seco, vemos um número significativamente menor de área consumida pelo fogo este ano, comparado a 2020", diz o secretário do Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul, Jaime Verruck.

No ano passado, o Pantanal foi castigado com um recorde de incêndios, o que fez a gestão Jair Bolsonaro ser alvo de pressões dentro e fora do Brasil. Neste ano, dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), órgão do Ministério da Ciência e Tecnologia, também mostraram que junho teve o número mais alto de queimadas na Amazônia desde 2007. Da mesma forma, no Cerrado o total de focos foi recorde.

A estiagem este ano, mais severa este ano, pode piorar a situação das queimadas. Além disso, traz a ameaça de racionamento de energia elétrica.

Verruck fala em "anomalia climática" e diz que a previsão meteorológica para o segundo semestre mostra que o volume de chuvas no Estado nos meses de julho, agosto e setembro será de 40% a 50% abaixo do que é esperado para o período.

No fim da tarde de ontem, as equipes lutavam contra as chamas que a região de Tarumã, em Nhecolândia, distrito de Corumbá. A falta de chuvas e a baixa umidade do ar favorecem a propagação do calor. "A vegetação está extremamente seca e o fogo se espalha como se fosse combustível. Fica difícil acompanhar a velocidade do fogo sem apoio aéreo. Felizmente chegaram duas aeronaves para lançar água nos pontos inacessíveis", contou o tenente bombeiro Jônatas Lira Costa e Silva.

Os aviões modelo Air Tractor têm capacidade para despejar dois mil litros em cada sobrevoo. Nessa área, segundo o tenente, equipes de solo com 34 militares faziam o combate às chamas. No domingo, um helicóptero da Marinha já havia sido usado para combater os focos de fogo no Canal do Tamengo, na margem direita do rio Paraguai, na fronteira com a Bolívia. Por ser uma hidrovia de escoamento de cargas, no trecho haviam barcaças carregadas com combustível aproadas no barranco do canal.

As regiões de Nhecolândia e Paraguai-mirim, segundo os bombeiros, são de fazendas de área extensa, sem muitas estradas, o que dificulta o acesso aos focos de incêndio. Em vários pontos o terreno é composto por turfa, material orgânico acumulado no subsolo, onde acontece o chamado fogo subterrâneo. No período de seca severa, como agora, esse material se torna altamente inflamável.

Segundo Verruck, o Estado investiu R$ 56,6 milhões em veículos e equipamentos para fazer frente à nova temporada de queimadas. O governo estuda decretar emergência em alguns municípios para facilitar as ações de combate ao fogo.

Ameaça ao turismo. Na região de Porto Morrinho, o turismo pesqueiro espera ser afetado pela fumaça dos incêndios em breve. "Não tem como correr: não chove, este tempo seco. De um jeito ou de outro vai afetar o turismo. Já vem afetando a falta de água, a isca, a gasolina, a covid", afirmou Getúlio de Souza, proprietário da pousada Vida Selvagem de Corumbá.

Enquanto isso, à margem do Corixo Gonçalinho, ligado ao Rio Paraguai, a pousada Jund Pesca está sem reservas de maio a outubro porque a baixa do nível do canal impossibilitou a saída de barcos. De acordo com a pousada, há dois anos não é realizada a dragagem do corixo, que sustenta 20 estabelecimentos de turismo. / Colaborou Amanda Calazans, Especial para O Estadão

Bioma único

65%

Do Pantanal brasileiro ficam no Estado de Mato Grosso do Sul e 35% no Mato Grosso. Internacionalmente conhecido por sua beleza, fauna e atrativos turísticos, o bioma engloba Brasil, Paraguai e Bolívia. Os incêndios costumam ocorrer de julho a setembro.