O Globo, n. 32765, 22/04/2023. Opinião, p. 2

Contribuição a sindicatos não deve ser compulsória



Foi mais que oportuno o pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), num julgamento que pode restabelecer contribuições compulsórias a sindicatos, extintas na reforma trabalhista de 2017. Ao contrário do que o Supremo decidira antes no caso das contribuições sindical e confederativa, o relator, ministro Gilmar Mendes, mudou de ideia e decidiu acolher a demanda para tornar obrigatória a contribuição assistencial.

O voto de Gilmar representa uma reviravolta na posição que ele próprio defendera neste caso e em votações anteriores a respeito do tema no STF. Foi provocada, segundo ele mesmo escreveu, pela argumentação do ministro Luís Roberto Barroso em favor da obrigatoriedade. Na votação em plenário virtual cujo encerramento estava previsto para a próxima segunda-feira, Barroso e a ministra Cármen Lúcia já haviam concordado com Gilmar, até o pedido de vista de Moraes.

O argumento central de Barroso para defender a obrigatoriedade é o enfraquecimento das finanças dos sindicatos, decorrente do fim da contribuição sindical compulsória e das decisões anteriores do Supremo sobre as contribuições confederativa e assistencial. “Tendo em vista a natureza não tributária dessas contribuições, o STF entendeu que, em ambos os casos, a cobrança de empregados não filiados ao sindicato violaria a liberdade de associação”, escreveu Barroso em seu voto.

Para reerguer os sindicatos, ele sugere que a contribuição assistencial — cujo objetivo é fortalecer negociações coletivas que beneficiam toda a categoria — seja como regra cobrada de todos, mesmo dos não sindicalizados, mas que o funcionário possa recusar pagá-la (“direito de oposição”).

Se prevalecer, a decisão representará um retrocesso. Ela advém de uma visão antiquada da atividade sindical. Uma vez que uma minoria exercerá o tal “direito de oposição”, na prática ela restabelece uma fonte estável de dinheiro para as associações, sem que elas precisem oferecer nada em troca por isso. O argumento de Barroso supõe que uma contribuição compulsória é a única forma de recompor as finanças sindicais. Trata-se de uma falácia. Antes da reforma trabalhista, a contribuição sindical era obrigatória apenas no Brasil, no Equador e no Egito. Não consta que nos demais países falte força ao movimento sindical por causa disso.

É verdade que os sindicatos perderam recursos. Pelos dados do Ministério do Trabalho, faturavam R$ 3 bilhões com a contribuição sindical em 2017 e passaram a receber R$ 66 milhões em 2021. Mas o espírito da reforma era justamente acabar com a fonte cativa de dinheiro, que sempre garantiu vida de elite aos líderes sindicais, sem grande benefício aos trabalhadores. Em vez disso, as associações de trabalhadores deveriam se modernizar e prestar serviços relevantes para fazer jus ao que recebem dos representados.

Acomodadas no modelo vigente de monopólio sindical por categoria, as lideranças sindicais preferem fazer pressão pela volta das contribuições compulsórias, instituídas na Era Vargas. Viram no novo governo do ex-sindicalista Luiz Inácio Lula da Silva a oportunidade de resgatar a vantagem perdida. Nas decisões anteriores, o Supremo teve o bom senso de expor a inconstitucionalidade de recriar um imposto sindical. 
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