O Estado de São Paulo, n. 46672, 30/07/2021. Política p.A12

 

'Fascismo' a brasileira tem abrigo no PTB

 

Neointegralismo. Sigla de Roberto Jefferson filia membros da Frente Integralista e marca guinada ao extremismo

Caio Sartori 

Depois do trabalhismo dos anos pré-1964 e do fisiologismo posterior à redemocratização, o integralismo – versão brasileira do fascismo – chegou ao PTB. Fundada em 1945 por Getúlio Vargas, a sigla foi a casa das duas primeiras gerações trabalhistas, inclusive do presidente João Goulart, mas está cada vez mais radicalizado à direita.

Seu presidente, o ex-deputado Roberto Jefferson – condenado e preso por corrupção no mensalão –, personifica hoje o bolsonarismo: adotou um discurso armamentista, religioso e anticomunista. Um dos marcos da guinada à direita do partido é a recepção, em suas fileiras, a grupos declaradamente fascistas. No mês passado, integrantes da Frente Integralista Brasileira (FIB), entre eles o presidente Moisés José Lima, filiaram-se ao PTB em São Paulo. O grupo afirmou em comunicado que a sigla se converteu numa casa para os integralistas que quiserem disputar eleições no ano que vem e em 2024.

Fundado em 1932 pelo jornalista Plínio Salgado, o integralismo imitava o fascismo italiano, de Benito Mussolini. "Por mais contraditório que pareça a alguns, o fato de (o PTB) ter certa ligação no passado com Getúlio Vargas, a realidade é que a única ligação é histórica: desde sua refundação nos anos 80 até recentemente, o partido seguiu certo pragmatismo que já era observado no PTB de décadas anteriores", disse em seu site a Frente Integralista. "Tendo no último ano uma revisão doutrinária intensa, assumiram-se como bandeiras estatutárias a defesa da vida, o patriotismo, a família tradicional e os valores cristãos."

Autor do livro O fascismo em camisas verdes: do integralismo ao neointegralismo em parceria com Leandro Pereira Gonçalves, o historiador Odilon Caldeira Neto diz que os grupos neointegralistas sempre buscam aproximação com algum partido político estabelecido. No Brasil essa prática começou, afirma, com o antigo Prona, de Enéas Carneiro, passou pelo PRTB de Levy Fidelix e agora dá sinais de que tentará o mesmo com o PTB. "Parece que, nesse sentido, o Roberto Jefferson virou o novo Levy. Foi Levy, na eleição de 2010, quem ajudou a popularizar certas ideias radicais. Com a emergência das chamadas novas direitas, ele e o PRTB fizeram um grande esforço em prol da sua radicalização", afirmou Neto.

O historiador estima que a FIB não tenha mais que algumas centenas de militantes, o que também é uma característica de grupos neofascistas de outros países. Eles não tentam ser uma organização de massa – diferentemente do passado, quando protagonizavam desfiles militarizados, uniformizados de verde e com braçadeiras com o sigma. Preferem se aproximar de grupos mais amplos, que tenham poder. Nos anos 50 e 60, chegaram a se reorganizar no Partido de Representação Popular (PRP), sem expressão.

Interlocutor da FIB com a institucionalidade, o advogado Paulo Fernando Melo da Costa, ex-secretário especial da ministra Damares Alves (Mulher, Família e Direitos Humanos), atuou pela soltura dos militantes bolsonaristas Sara Giromini e Oswaldo Eustáquio, acusados de atentar contra a democracia. Foi Costa quem articulou as filiações de integralistas ao PTB.

Caldeira Neto considera que os valores morais defendidos pelos neointegralistas são os mesmos de segmentos maiores do conservadorismo brasileiro, o que os aproxima do bolsonarismo. Mas vão além da defesa um tanto quanto genérica da "família" e cultivam visões de Estado inspiradas no fascismo. "Defendem um certo tipo de organização da sociedade: integral, antidemocrática, antiparlamentarista; a extinção dos partidos políticos, o controle da imprensa e assim por diante. Inspiramse de forma muito afeiçoada no modelo de sociedade integral do tempo do fascismo."

Em nota, a FIB nega ser versão brasileira do fascismo, ao contrário do que dizem historiadores. "Diversas críticas ao fascismo e movimentos diversos foram feitas – durante e inclusive antes mesmo da AIB – por Plínio Salgado", diz a nota, assinada por Lucas Carvalho, secretário-geral da FIB. A Frente alega o PTB não passa a ser necessariamente a casa dos neointegralistas, que estão espalhados por outras legendas.

 

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Empresário bolsonarista assume sigla de Roberto Jefferson em SP


Otávio Fakhoury, investigado por ataques ao Supremo, não descarta concorrer nas eleições do ano que vem

Pedro Venceslau

 

Investigado em inquéritos do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre propagação de notícias falsas e financiamento de atos antidemocráticos, o empresário Otávio Fakhoury, apoiador do presidente Jair Bolsonaro, entrou na política partidária e assumiu nesta semana a presidência estadual do PTB. Embora diga que não é um "político profissional", ele não descarta disputar um cargo eletivo no ano que vem.

Segundo Fakhoury, só em São Paulo a executiva nacional petebista, comandada pelo ex-deputado Roberto Jefferson, "derrubou" o comando de mais 300 diretórios municipais petebistas não alinhados com o Planalto.

Empresário do ramo imobiliário, Fakhoury começou sua militância no grupo Vem Pra Rua em meio às manifestações pelo impeachment de Dilma Rousseff (PT) em 2016. Ele admite que chegou a ajudar financeiramente alguns grupos, mas nega que tenha patrocinado atos antidemocráticos contra o STF. "Nem conheço a Sara Giromini (uma das pessoas que lideram atos e ataques ao Supremo). Não sou extremo. Não sabia isso dos integralistas. Nem conheço eles", disse o empresário ao Estadão.

Fakhoury assumiu sua nova função com um discurso afinado com o presidente da República: defesa de medicamentos contra covid-19 sem eficácia comprovada, relativização da vacina – que, segundo ele, é "experimental" – armas, voto auditável, "direito à vida" e rejeição radical à esquerda.

No entanto, quando questionado sobre a contradição entre o discurso de Bolsonaro em 2018 contra o Centrão e a chegada do senador Ciro Nogueira (Progressistas-PI), expoente do grupo, à Casa Civil, o empresário desconversa. "O presidente tentou fazer o menor número possível de concessões em 2018, mas não conseguiu. Quem governa sem o Congresso é ditador. Sem um acordo republicano com o centro não dá para governar", afirmou. Ele cobra, no entanto, que Bolsonaro exija contrapartidas, como a aprovação no Congresso do voto impresso.

Sobre a estratégia política para o ano que vem, Fakhoury deixou claro que a prioridade do PTB será fazer uma composição com Bolsonaro, ou mesmo receber o eventual candidato a governador de São Paulo escolhido por ele. Em troca, indicaria um nome para vice-governador ou senador. Ele sondou Abraham Weintraub, Ricardo Salles, Felipe Sabará e Luiz Philippe de Orleans e Bragança para ingressarem na legenda.

Dono da EEPOF Empreendimentos e Participações Imobiliárias, Fakhoury disse que em breve vai anunciar "novidades" sobre seus planos de montar uma rede de comunicação conservadora de direita no Brasil.