O Globo, n. 32762, 19/04/2023. Política, p. 4

Aliado incômodo

Jeniffer Gularte
Gabriel Sabóia


Pressionado por novas invasões do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), seu aliado histórico e ativo na última campanha etoral, o Lula cedeu ao grupo e trocou ontem mais postos regionais do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). Em público, porém, s elevaram o tom contra o movimento e criticaram as ações, na tentativa de conter danos no . Responsável pela área, Paulo Teixeira (Desenvolvimento Agrário) condicionou a continuidade do programa de reforma agrária à desocupação das propriedades.

Em paralelo, das 29 superintendências do Incra, sete foram trocadas ontem por nomes indicados por movimentos populares do campo de cada estado. As mudanças foram publicadas no Diário Oficial da União. O já havia atendido em parte a reivindicação de substituir superintendentes nomeados durante o de Jair Bolsonaro.

Nos últimos dias, o MST invadiu fazendas em Pernambuco, uma área da Empresa Brasira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) no estado e outra da empresa Suzano no Espírito Santo, além de ocupar sedes do Incra em 12 estados.

Para dar uma resposta, o Paulo Teixeira se posicionou pela desocupação das terras.

— A minha opinião é que essa jornada de luta já acabou. Estamos pedindo as retiradas, para prosseguir o programa de reforma agrária. O nosso condicionante é esse. O já tem compromisso com a reforma agrária. Tem programas a apresentar. E sse tipo de ação nessa direção não muda nada —afirmou ao GLOBO.

Fávaro: “crime”

Já o da Agricultura, Carlos Fávaro, usou as redes sociais para reagir com veemência ao MST e qualificou os atos como “crime”. As falas do integrante do primeiro escalão são endossadas pelo próprio , segundo interlocutores.

As invasões do MST fazem parte do chamado Abril Vermelho, jornada anual de lutas do movimento em prol da reforma agrária. A ação nas dependências da Embrapa, a mais criticada, ocorreu na madrugada de 16 de abril.

Em nota, o órgão se manifestou afirmando que o movimento ocupou “terras agricultáveis e de preservação da Caatinga”, que tem sido utilizada para “instalação de experimentos diver(PP-ES), sos e multiplicação de material genético básico”.

“Inaceitável! Sempre defendi que o trabalhador vocacionado tenha direito à terra. Mas à terra que lhe é de direito! A Embrapa, prestes a completar 50 anos, é um dos maiores patrimônios do nosso país. O agro produz com sustentabilidade e se apoia nas pesquisas e todo o trabalho de desenvolvimento promovido pela Embrapa. Atentar contra isso está muito longe de ser ocupação, luta ou manifestação. Atentar contra a ciência, contra a produção sustentável, é crime, e crime próprio de negacionistas”, escreveu Fávaro nas redes.

Segundo aliados de Lula, o vem afirmando que é contra invasões de terras produtivas. Segundo relatos, o petista chegou a afirmar que, se o é contra invasões ao Palácio do Planalto, ao e ao Supremo Tribunal Federal (), em referência aos atos golpistas de 8 de janeiro, será contra a ocupação de áreas privadas e produtivas. O petista, contudo, não pretende se manifestar publicamente.

A falta de posicionamento mais contundente poderá criar obstáculos no Legislativo. Integrantes de partidos da base aliada afirmam que as bandeiras do MST não têm respaldo em diversas legendas, o que pode refletir em constrangimentos.

O deputado Evair de Melo um dos vice-s da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), chegou a protocolar na Procuradoria-Geral da República (PGR) um pedido de prisão de João Pedro Stédile, líder do MST —Stédile foi à China na comitiva de Lula. Na avaliação do deputado, os posicionamentos de s são insuficientes.

— O está numa sinuca de bico. Aceitou apoio político do MST durante a campanha etoral. O MST diz que caminhou com Lula e agora está cobrando apoio de volta. O percebeu que não tem apoio da população para isso. A grande maioria é contra invasão de propriedade privada. O está com um elefante na sala, pois não tem como se livrar do MST —diz o parlamentar.

O MST foi um dos responsáveis por organizar a Vigília Lula Livre, que esteve por 580 dias em frente à sede da Polícia Federal em Curitiba, enquanto o petista esteve preso. Lula já agradeceu publicamente o apoio do movimento neste período. João Paulo Rodrigues, líder nacional do MST, foi um dos coordenadores da campanha de Lula à Presidência.

Em outro movimento para conter os reflexos negativos, o das Relações Institucionais, Alexandre Padilha (PT), também condenou as invasões, assim como Paulo Teixeira e Carlos Fávaro.

— Eu condeno veementemente qualquer ato que danifique áreas e processos produtivos. Não é a melhor forma de lutar para qualquer coisa. Temos outros instrumentos para as mais variadas lutas —afirmou.

Padilha, entretanto, minimiza o eventual impacto das invasões na aprovação de pautas caras ao no :

— Acho que não tem qualquer relação entre uma coisa e outra, mas reforço que nós temos outros instrumentos melhores.

Nomeações no INCRA

Os sete nomeados ontem para superintendências do Incra foram: Nelson José Grasselli no Rio Grande do Sul; Francisco Erivando Santos de Sousa no Ceará; Paulo Roberto da Silva em Mato Grosso do Sul; Elias D’Angelo Borges em Goiás; Nilton Bezerra Guedes no Paraná; Maria Lúcia de Pontes no Rio de Janeiro; e Edvânio Santos de Oliveira em Mato Grosso.

Após área da Suzano ser invadida, a empresa afirmou, em nota, que foi “surpreendida”. São “duas áreas produtivas da Suzano no dia de hoje, no estado do Espírito Santo, mesmo em um contexto de diálogo e construção de convergência entre as partes”.