O Estado de S. Paulo, n. 46651, 09/07/2021. Economia, p. B8

Pacto busca equidade racial nas empresas

Marina Aragão


Depois de mais de um ano de discussões, organizações do terceiro setor e da sociedade civil lançaram ontem o Pacto de Promoção da Equidade Racial no Brasil. A iniciativa pretende implementar um protocolo ESG (sigla em inglês para questões ambientais, sociais e de governança) com recorte racial nas empresas do País. A elaboração do documento envolveu a participação de 140 pessoas, incluindo representantes da comunidade negra, acadêmicos, empresários e líderes de ONGs.

Embora sejam a maior parte da força de trabalho no Brasil – 54,9% –, os negros são maioria entre as pessoas desocupadas e subocupadas. Eles correspondem a dois terços do grupo que não tem emprego (64,2%) e do contingente que trabalha menos horas do que gostaria (66,1%). Os dados são do estudo Desigualdades Sociais por Cor ou Raça no Brasil 2019, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Focado nesse cenário, o pacto – que inclui entidades como PretaHub, Fundo Baobá e Oxfam Brasil –, visa a ampliar a quantidade de negros nas empresas e incentivar a adoção de ações afirmativas, além de melhorar a qualidade da educação pública brasileira. “Primeiro, entendemos que fazia todo sentido mexer na pauta ESG (das empresas) porque seria importante que os investidores apostassem nisso”, diz Gilberto Costa, diretor executivo da associação do pacto e do banco JP Morgan no Brasil.

O processo de adesão é voluntário e gratuito – as empresas interessadas assinarão um termo de parceria com a Associação de Promoção da Equidade Racial. Com base no protocolo, as corporações deverão calcular o seu respectivo Índice ESG de Equidade Racial (IEER).

Esse indicador servirá para medir o desequilíbrio racial dentro das organizações quando comparado ao porcentual de negros na população economicamente ativa na região em que a empresa atua. “Isso é importante para saber os locais que estão avançando, além de poder comparar empresas e gerar um incentivo”, destaca Costa.

Segundo o pacto, pretos e pardos que conseguem entrar no mercado formal dificilmente alcançam cargo de liderança ou tomada de decisão. Uma pesquisa do Instituto Ethos mostrou que os negros ocupam apenas 4,9% das cadeiras nos conselhos de administração das 500 empresas de maior receita do Brasil. Entre os quadros executivos, eles são 4,7%. Na gerência, correspondem a apenas 6,3%.

Para medir esses números, o IEER é organizado em três níveis: N1, que reflete a condição de equilíbrio racial atual da empresa, atribuindo maior peso à participação de negros em cargos de liderança; N2, que considera a adoção de ações afirmativas, contemplando recrutamento, permanência e promoção de profissionais; e N3, que considera os investimentos sociais voltados à equidade racial. Para cada ação afirmativa adotada, serão somados pontos em uma classificação que vai de A++ (melhor nível) a H (pior nível).

“O pacto oferece as diretrizes, mas quem escolhe quais estratégias serão implementadas é a empresa”, explica Jair Ribeiro, um dos idealizadores da iniciativa e presidente da Associação Parceiros da Educação. Elas deverão escolher instituições certificadoras que avaliarão seu desempenho na aplicação das metas. Ribeiro diz que a pontuação deve ser revisada anualmente com o objetivo de monitorar o cumprimento do protocolo.

Para Carlos Eduardo Altona, sócio-fundador da consultoria de recursos humanos Exec, as pessoas têm priorizado cada vez mais empresas pautadas no propósito e na cultura, uma vez que “o tema da diversidade e inclusão está diretamente ligado aos valores” das organizações. “Vemos um movimento de mercado, com vários agentes institucionais relevantes que estão colocando pressão para que as empresas possam implementar essas estratégias”, diz.