O Estado de São Paulo, n. 46663, 21/07/2021. Metrópole p.A15

 

Cidade de SP registra 8 casos da Delta; Saúde envia vacina extra para fronteiras

 

Felipe Resk

Fabio Grellet

 

A cidade de São Paulo já registra ao menos oito casos da variante Delta, cepa mais transmissível do coronavírus. A Prefeitura diz já haver transmissão comunitária da variante. O Ministério da Saúde reporta 122 casos no País, mas o balanço está defasado, pois considera só um infectado da capital paulista. Especialistas acreditam que o número no País seja maior, diante de falhas de monitoramento. Para tentar conter o avanço de variantes, o governo federal envia vacinas extras a seis Estados das fronteiras.

O primeiro caso da Delta na capital paulista, de um homem de 45 anos, havia sido confirmado no último dia 5 na região do Belenzinho, zona leste da capital. Por causa do episódio, cerca de 40 pessoas que tiveram contato com o paciente passaram a ser monitoradas pelas equipes de saúde e vigilância sanitária, conforme a Prefeitura.

A Prefeitura diz ter realizado análise dirigida com cerca de 60 testes positivos de covid-19 para três laboratórios. O sequenciamento genético é necessário para identificar a cepa do vírus. “Ao final de todo trabalho, pôde se confirmar a transmissão comunitária da variante Delta na cidade de São Paulo”, afirmou o secretário municipal de Saúde, Edison Aparecido.

Após essa rodada de exames, a Prefeitura agora confirma mais sete ocorrências da Delta. Entre os novos registros, quatro foram notificados nas regiões do Belenzinho, Aricanduva e Mooca, na zona leste.

Mais dois diagnósticos foram constatados na Vila Guilherme, zona norte. Também houve confirmação para um internado no Hospital Albert Einstein. Segundo a pasta municipal, todos os pacientes estariam bem.

A secretaria afirma ter identificado, ainda, mais um diagnóstico – mas era um paciente do Rio, que já voltou ao Estado.

O Rio é onde está a maioria dos casos relatados (84) da Delta, identificada originalmente na Índia. Mas o Estado parou de divulgar ontem o total absoluto de casos – só informa proporção de positivos para a cepa.

Segundo a pasta, a rodada de testes mais recente englobou 400 amostras, das quais em 380 foi possível identificar a linhagem do vírus. Nesse grupo de 380, aproximadamente 78% eram da Gama (identificada originalmente em Manaus) e cerca de 16% da Delta. Nos Estados Unidos, autoridades já projetam que 83% dos novos casos sejam da Delta.

No Brasil, além de Rio e São Paulo, aparecem no balanço do ministério Paraná (13), Maranhão (6), Santa Catarina (5), Rio Grande do Sul (3), Goiás (2) e Pernambuco (2) e Minas (1). Houve cinco mortes – quatro no Paraná e uma no Maranhão.

 

Fronteiras. A estratégia do governo federal para frear o espalhamento de variantes inclui o envio de vacinas extras para Estados que fazem fronteiras com outros países. Paraná, Rio Grande do Sul, Mato Grosso e Rondônia já receberam doses.

Nesta semana, Acre, Amapá, Amazonas, Roraima, Pará e Santa Catarina recebem lotes para imunização dessas áreas. Em visita, ontem, a Foz do Iguaçu, na tríplice fronteira com Paraguai e Argentina, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, disse que o objetivo é criar um “cordão epidemiológico”. Segundo o governo, o grupo já imunizado nessa estratégia envolve meio milhão de pessoas.

No início deste mês, Mato Grosso do Sul recebeu uma remessa de 207 mil doses da vacina Janssen, de dose única, para reforçar a proteção de 79 cidades fronteiriças. Em 13 delas, está sendo conduzido um estudo de vacinação em massa com o imunizante da Janssen.

Em maio, o ministério chegou a enviar doses extras ao Maranhão após a identificação dos primeiros casos no Brasil. Pernambuco pediu no domingo um lote adicional por causa do registro de casos entre filipinos tripulantes de um navio.

Por causa da Delta, governos têm liberado a diminuição do intervalo entre as aplicações das vacinas da Astrazeneca ou Pfizer, com fizeram o Estado do Rio e o Distrito Federal. A justificativa é ter parcela maior da população com o esquema vacinal completo, sobretudo entre os grupos mais vulneráveis.

A redução do intervalo tem sido de doze para dez ou oito semanas. A redução do tempo entre as injeções divide especialistas. A Fiocruz, responsável por produzir o imunizante Oxford/astrazeneca no Brasil, se manifestou de forma contrária a encurtar o intervalo.

 

Avanço

83%

dos novos casos, nos Estados Unidos, são da Delta, conforme estimativa das autoridades sanitárias. No Brasil, a maioria dos casos relatados é no Rio.

 

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Apesar de imunização, especialistas veem risco de nova onda


Variante Delta é mais transmissível; virologista recomenda rastreamento de contatos e quarentena para assintomáticos

Roberta Jansen

Com o espalhamento da Delta no Brasil, especialistas alertam para o risco de uma nova onda, apesar do avanço da vacinação pelo País. Um dos obstáculos para a nova variante no Brasil é vencer a Gama, que teve origem em Manaus e hoje é a cepa predominante.

"Não podemos relaxar; precisamos rastrear os casos e os contatos, isolar as pessoas, reforçar a vigilância epidemiológica e genômica, manter as medidas de isolamento e uso de máscara, e ampliar a vacinação", enumera a presidente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva, Gulnar Azevedo e Silva, professora do Instituto de Medicina Social da Universidade do Estado do Rio (Uerj). "Se nada disso for feito, corremos o risco, sim, de termos uma quarta onda."

Estudos mostram que a Delta é mais transmissível do que as demais cepas, mas não necessariamente mais agressiva. Cientistas ressaltam que a variante se espalhou em países onde boa parte da população já está vacinada. Isso poderia explicar o baixo número de internações e mortes. Já se sabe também que apenas a primeira dose de um imunizante pode não ser suficiente para barrar a infecção. É complexo prever como a Delta se comportaria no Brasil, que tem menos de 20% da população imunizada com duas doses.

"É difícil avaliar porque não temos nenhum outro país com a mesma situação epidemiológica do Brasil para comparar", afirmou o virologista Fernando Spilki, da Universidade Feevale, no Rio Grande do Sul. "Os países europeus tiveram medidas de controle muito mais rígidas e estavam com a vacinação mais avançada." Segundo o especialista, o ideal é tentar evitar, pelo maior tempo possível, a transmissão comunitária da Delta no Brasil. É muito provável, porém, que ela já esteja circulando no Rio e em São Paulo.

"Temos que fazer a identificação dos casos, rastrear os contatos, mesmo os assintomáticos, quarentenando as pessoas", disse Spilki. "Ainda dá pra fazer isso. Quando estivermos com centenas ou milhares de casos, não será mais possível."

Presidente da Sociedade Brasileira de Virologia, Flávio Guimarães, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), acha cada vez mais difícil fazer previsões sobre a pandemia. Mas avalia que ainda é possível que a predominância da variante Gama no País impeça a disseminação da Delta.

"Nossas fronteiras são tão ou mais porosas do que a dos outros países, claramente já fomos expostos à Delta", pondera. "Se ela ainda não é predominante é porque algo a está impedindo." Guimarães chama atenção também para o fato de que o Rio é o Estado que faz o maior número de sequenciamentos genéticos do vírus. São 800 amostras por mês, em média. Essa peculiaridade pode criar uma percepção alterada da presença da Delta. "Os números ainda são tímidos para chegarmos a qualquer conclusão.