O Globo, n. 32754, 11/04/2023. Política, p. 9

Ministra do Turismo e cinco deputados pedem para sair do União Brasil

Bruno Góes
Lauriberto Pompeu


Em meio à rebelião no União Brasil, a ministra do Turismo, Daniela Carneiro, e outros cinco parlamentares da bancada do Rio na Câmara pediram o aval da Justiça Eleitoral para sair do partido. Os deputados querem “justa causa” para a desfiliação, sob o argumento de “assédio” por parte da direção nacional da sigla.

Como revelou O GLOBO ontem, o partido passa por uma disputa política interna em vários estados, com corte de senha e acusações de fraude. O movimento dos parlamentares do Rio, com apresentação da ação na última quinta-feira, pode ter impacto na formação do Ministério do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, já que Daniela ocupa uma das três vagas reservadas ao União Brasil no primeiro escalão do governo.

O marido de Daniela Carneiro e presidente do diretório fluminense, Waguinho, prefeito de Belford Roxo, na Baixada Fluminense, também pediu a desfiliação da legenda ontem. À noite, selou a entrada no Republicanos, partido que, aos poucos, vem se aproximando do Palácio do Planalto —em entrevista, o líder do PT na Câmara, Zeca Dirceu (PR), defendeu a oferta de cargos como forma de atrair a sigla à base.

Além de Daniela , pediram a desfiliação da legenda os deputados Chiquinho Brazão, Juninho do Pneu, Marcos Soares, Ricardo Abrão e Dani Cunha.

Da bancada fluminense, o único fora da lista é Murillo Gouvea.

Para justificar o pedido, os deputados citam o corte de senha do diretório estadual, que permitia a destinação de recursos do fundo partidário e a nomeação de comissões municipais provisórias. Sem isso, não há como organizar uma convenção estadual.

“A medida (de cassar a senha) imposta pelo presidente Luciano Bivar e seu vice, Antônio Rueda, não passou por consulta à direção nacional, da qual também faz parte o secretário-geral (...) Cumpre repisar que o arbitrário ato impede a formação e consolidação das bases do partido no estado, bem como qualquer iniciativa dirigida à preparação para as eleições municipais (2024) e geral (2026)”, argumentam os advogados dos parlamentares.

No Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o processo foi remetido ao gabinete do ministro Ricardo Lewandowski, que se aposenta oficialmente hoje. Segundo integrantes da sigla ouvidos pelo GLOBO, o desentendimento atual da bancada do Rio começou com a movimentação de Antônio Rueda para retirar o prefeito de Belford Roxo da direção estadual do União.

Parlamentares afirmam que Rueda trabalha para filiar o deputado estadual Rodrigo Bacellar (PL), presidente da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), que assumiria o partido no estado. Além disso, os deputados da legenda veem tentativa do vice de emplacar o deputado estadual Márcio Canella (União), ex-aliado político de Waguinho, como candidato do partido a prefeito de Belford Roxo no ano que vem.

Relatos de pressão

A gota d’água da briga, porém, foi a negociação de Bivar e Rueda com o governador do Rio, Cláudio Castro (PL), para preencher cargos no Rioprevidência e no Detran. Os parlamentares reclamam que nem sequer foram consultados sobre as indicações. Waguinho chegou a levar as reclamações a Bivar, que reagiu cortando o acesso do presidente estadual da legenda ao sistema que permite movimentar o fundo partidário. O União tem 59 deputados, a terceira maior bancada.

Na ação apresentada à Justiça, os parlamentares também pediram que as desfiliações sejam acompanhadas de decisão pela perda de parte do tempo de TV e do fundo partidário do União Brasil.

Os deputados relatam que foram alvos de comentários como “tomara que saia do partido”, “ninguém presta”, “prefiro começar o partido do zero no Rio” e “vou expulsar”. A ação também cita cargos que seriam indicações de Rueda nas gestões do governador Cláudio Castro (PL) e do prefeito Eduardo Paes (PSD).

“Os requerentes também têm sido obrigados a assistir investidas junto aos governos do estado e da capital para a obtenção de cargos, como o controle do Detran/RJ, destinado a Antônio Rueda, sem qualquer justificativa ou comunicação às bases locais. O mesmo ocorreu com a obtenção da poderosa Secretaria Municipal de Habitação do Rio de Janeiro, em que ele indicou aliado para o cargo de secretário, sem qualquer votação ou comunicação aos requerentes”.

Além do corte da senha, os deputados citam desentendimentos em relação à eleição municipal do ano que vem como razão para sair da legenda. Segundo a representação assinada por eles, Bivar e Rueda tentaram filiar o deputado Pedro Paulo (PSD-RJ) em um acordo que passaria pelo apoio do partido à reeleição de Paes como prefeito do Rio. Os deputados dizem que a ideia seria lançar Pedro Paulo como candidato a vice na chapa de reeleição.

“Os requerentes — além de não terem sido questionados quanto ao apoio a possível reeleição de Eduardo Paes —, não concordam com a filiação (de Pedro Paulo), razão pela qual não desejam compartilhar a mesma legenda que ele. Da parte das deputadas Daniela do Waguinho e Dani Cunha, as restrições à filiação são de natureza pessoal. Ademais, existem outros candidatos, já filiados ao partido, que poderiam se interessar pelo cargo, tanto de vice, quanto de prefeito”, relata a peça processual.

Procurado, Paes disse que “não tem a ver com briga interna dos outros”. Pedro Paulo seguiu a mesma linha.

— Sou presidente do diretório estadual do PSD, não tenho nada a comentar sobre problemas internos do União Brasil —declarou.

Disputas internas

O documento assinado pela ministra e pelos deputados também cita outros casos em que consideram que houve “intolerância à democracia intrapartidária”, como disputas em Pernambuco e Mato Grosso do Sul.

A ação diz que Bivar e seus aliados criaram “dezenas de comissões municipais”, destinadas a “fabricar a maioria que precisavam” para impedir que o deputado Mendonça Filho assumisse o partido em Pernambuco.

Da mesma forma, os parlamentares afirmaram que, em Mato Grosso do Sul. Bivar e a senadora Soraya Thronicke (União-MS) “partiram para a recorrente estratégias antidemocráticas, levada a cabo com o cancelamentos de filiação e exclusão de cargos partidários, com direito à voto, de seus opositores”.