O Estado de S. Paulo, n. 46637, 25/06/2021. Política, p. A6

Gilmar estende suspeição de Moro

Rayssa Motta


O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), decidiu ontem estender os efeitos da declaração de suspeição do ex-juiz Sergio Moro a outros dois processos da Lava Jato envolvendo o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT): o do sítio de Atibaia e o da doação do terreno para sediar o Instituto Lula. A decisão individual foi tomada um dia após o plenário da Corte bater o martelo sobre a parcialidade de Moro na ação penal do triplex do Guarujá, que levou o petista à prisão por 580 dias e o deixou de fora das eleições de 2018.

Lula havia sido condenado pelo ex-juiz a 9 anos e seis meses de prisão no caso do triplex. Em seu despacho, o ministro observou que os fundamentos que levaram o Supremo a concluir pela suspeição no caso de Atibaia são compartilhados nas demais ações penais.

“Por isonomia e segurança jurídica, é dever deste Tribunal, por meio do relator do feito, estender a decisão aos casos pertinentes, quando há identidade fática e jurídica”, escreveu Gilmar Mendes na sua decisão.

Na prática, ao ampliar o alcance da declaração de suspeição, a pedido da defesa de Lula, Gilmar Mendes também coloca os demais processos de volta à estaca zero. Isso porque todas as decisões tomadas por Moro foram anuladas, incluindo sentenças, coleta de depoimentos e provas, de modo que apenas elementos probatórios juntados aos autos ficam de pé.

O efeito cascata compromete uma sentença que nem sequer foi assinada por Moro. Na ação do sítio de Atibaia, Lula havia sido condenado a 12 anos e 11 meses de prisão, por corrupção e lavagem de dinheiro, pela juíza Gabriela Hardt, que herdou o processo das mãos do ex-juiz da Lava Jato quando ele deixou a magistratura para ser ministro do governo Bolsonaro.

Já o processo sobre as doações da Odebrecht ao Instituto Lula não chegou a ser sentenciado. “Nos três processos, houve a persecução penal do paciente em cenário permeado pelas marcantes atuações parciais e ilegítimas do ex-juiz Sergio Fernando Moro. Em todos os casos, a defesa arguiu a suspeição em momento oportuno e a reiterou em todas as instâncias judiciais pertinentes”, escreveu Gilmar.

Plenário. O Estadão apurou que a Procuradoria-Geral da República (PGR) deve entrar com um pedido para submeter a decisão monocrática ao crivo do plenário do Supremo. O advogado Marcelo Knopfelmacher, representante dos procuradores que integraram a extinta força-tarefa da Operação Lava Jato, criticou a decisão.

“Com o devido respeito, uma decisão monocrática sobre tema tão importante não prestigia o espírito de colegiado que deve prevalecer em nossos tribunais, inclusive e especialmente no STF”, afirmou.

Entre os pontos considerados pelos ministros para questionar a atuação de Moro estiveram a ordem para condução coercitiva de Lula para ser interrogado pela Polícia Federal nos autos da Operação Alethea, 24.ª fase da Lava Jato; o grampo no escritório de advocacia de Cristiano Zanin, que defende o ex-presidente; a obstrução ao cumprimento da decisão, tomada no plantão judiciário pelo desembargador do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, Rogério Favreto, que mandou soltar o petista em julho de 2018, quando ele estava preso em Curitiba e a retirada do sigilo de trechos da delação premiada do ex-ministro Antonio Palocci às vésperas das eleições de 2018.

Também foi questionado o vazamento da conversa entre Lula e a ex-presidente Dilma Rousseff (PT), que o nomeou como ministro chefe da Casa Civil; a assunção do cargo de Ministro da Justiça e Segurança Pública do governo Jair Bolsonaro e a entrada como sócio-diretor na consultoria Alvarez & Marsal, que presta serviços para empresas condenadas na Operação Lava Jato.

Aceno. Anteontem, após o plenário confirmar, pelo placar de 7 votos a 4, a suspeição no caso do triplex, Moro acenou aos ministros que votaram em seu favor e disse que não houve parcialidade. “Os votos dos ministros Fachin, Barroso, Marco Aurélio e Fux, não reconhecendo vícios ou parcialidade na condenação por corrupção do ex-presidente Lula, correspondem aos fatos ocorridos e ao Direito. Nunca houve qualquer restrição à defesa de Lula, cuja culpa foi reconhecida por dez juízes”, escreveu nas redes sociais.

Isonomia'

“Por isonomia e segurança jurídica, é dever deste Tribunal, por meio do relator do feito, estender a decisão aos casos pertinentes, quando há identidade fática e jurídica.”

Gilmar Mendes

Ministro do STF