Título: A bagunça francesa
Autor: Matthew Curtin
Fonte: Jornal do Brasil, 19/06/2005, Internacional, p. A9

A decisão dos líderes da União Européia de colocar de lado, temporariamente, o plano de suspender o embargo de venda de armas à China foi um dos resultados mais sensíveis da cúpula do bloco, na semana passada, em Bruxelas. Mais sensível ainda seria abandoná-lo completamente.

A campanha para o fim do embargo, liderada pela França, foi um projeto mal conduzido. Não houve lógica na missão de normalizar os laços militares entre a UE e a China. Se o presidente Jacques Chirac tivesse conseguido administrar a suspensão, teria demonstrado ao mundo que a França pode liderar a Europa.

A própria campanha é uma cotovelada nos Estados Unidos e sua cautela sobre as polêmicas da China: violação aos direitos humanos, o vasto Exército, sua agressiva atitude contra os aliados americanos Japão e Taiwan e a postura ambigüa em relação à tirania nuclear-ideológica da Coréia do Norte.

Mas os fatos trouxeram a França para a realidade. A visita do então primeiro-ministro, Jean-Pierre Raffarin, a Pequim, em abril, foi particularmente sem sentido. Afinal, se a China reconhecer o direito de independência de Taiwan não será por pressão de Paris.

Já o eleitorado francês se preocupa com uma grande aproximação com os chineses, porque acha que eles estão roubando seus empregos, quando empresas se mudam para escapar dos altos custos de produção da Europa e para servir melhor o mercado asiático.

No entanto, para o governo de Chirac, levantar o embargo significaria poder para conversar com Pequim sobre direitos humanos e dos trabalhadores, questões diletas dos franceses. Afinal, a proibição de venda de armas data de 1989 - uma forma de protestar contra o massacre da Praça da Paz Celestial.

Mas os eleitores franceses também temem perda de poder aquisitivo diante do fraco crescimento econômico. Nesse sentido, a importação de produtos chineses - obra de trabalho mal-remunerado - cai bem. O preço das roupas pode reduzir até 10% este ano na França devido aos baratos tecidos chineses.

A resposta do governo? Quer liderar negociações da UE para que a China coloque rédeas nas exportações têxteis. É exatamente por este tipo de pensamento instável que a administração de Chirac é vista como uma bagunça, tanto pelos cidadãos franceses quanto pelos parceiros da UE.