O Estado de São Paulo, n. 46751, 17/10/2021. Economia p.B2

 

Casuísmo na conta da gasolina

Celso Ming 

 

No governo Bolsonaro, o jogo de empurra dos preços da gasolina, do gás de cozinha e do diesel está longe de terminar.

Depois de ter temporariamente desistido de obrigar a Petrobras a assumir parte da alta dos preços dos combustíveis, que correspondem aos preços em dólares (veja o gráfico) praticados no mercado global convertidos em reais, o foco da hora passaram a ser os Estados e municípios.

Liderada por Arthur Lira, a Câmara dos Deputados acaba de aprovar, por 392 votos a favor e 72 contra, lei complementar que não apenas reduz, mas também congela o ICMS sobre a venda dos combustíveis por um ano, prazo suficiente para evitar mais erosão no projeto eleitoral do presidente Bolsonaro. A base de cálculo é a média dos dois últimos anos. Isso significa que, se as cotações do petróleo desabarem para a casa dos US$ 50 por barril, onde já estiveram, os preços dos combustíveis ficarão acima dos praticados no mercado. Então, a nova regra casuísta terá de ser mudada outra vez, por novo casuísmo.

Avaliações preliminares apontam que, se a lei complementar prevalecer, neste primeiro ano os Estados perderão R$ 24 bilhões em receitas e os municípios, R$ 6 bilhões.

A concentração dessa conta sobre os Estados, sem antes "ter combinado com os russos", parece montada para funcionar como revide aos governadores, que durante a pandemia se recusaram a fazer o jogo de Bolsonaro.

A matéria vai agora para exame do Senado, reduto de maior influência dos governadores, onde a resistência deve ser feroz e provavelmente decisiva. Se não passar, o problema ficará outra vez à espera de solução. Também nessa matéria a Câmara e o governo Bolsonaro não agem sobre as causas da alta. E aumentam as incertezas.

A cavalgada das cotações do petróleo e do gás natural no mercado internacional não é o único fator de alta dos combustíveis no mercado interno. A procura de bodes expiatórios e "pagatórios" não leva em conta que um dos mais importantes fatores da alta é Bolsonaro. Com seus negacionismos, com sua baixa disposição em tocar as reformas e pela insegurança no comando da política econômica, as cotações do dólar no câmbio interno ajudam a empurrar ainda mais os preços. É um estrago que as turbulências do período eleitoral tendem a aumentar.