O Estado de S. Paulo, n. 46603, 22/05/2021. Política, p. A4

Análise: O almoço pela democracia contra o bolsonarismo

Fernando Abrucio


O encontro entre os ex-presidentes Lula e FHC realça que o momento atual é o da conversa das várias forças democráticas para combater o bolsonarismo. Esse é o diagnóstico que embalou o almoço de ambos e que foi organizado por Nelson Jobim, uma liderança política que dialoga com todos e que passou pelos principais postos dos três Poderes da República brasileira. O que está em jogo são os ganhos obtidos pela democracia do País durante cerca de 30 anos, conquistados a duras penas, e para os quais tanto FHC como Lula tiveram participação decisiva.

O almoço, obviamente, não selou uma aliança política imediata. O mais provável é que cada um deles esteja em lados diferentes no primeiro turno da próxima eleição presidencial. Uma candidatura petista é quase irreversível, dado que Lula larga no mínimo com 30% dos votos. A busca de uma terceira via é uma aposta de FHC, seja para construir uma candidatura competitiva, seja para ajudar a montar para o longo prazo esse campo disperso que hoje ganha o nome de centro.

De todo modo, já se anuncia uma grande novidade para 2022 em relação a 2018: dessa vez, se houver um segundo turno entre Lula e Bolsonaro, muita gente que anulou o voto ou mesmo apoiou a candidatura bolsonarista ficará sem titubear com a liderança petista.

Mas o encontro dos ex-presidentes revela mais uma coisa: qualquer projeto de terceira via só é exequível se o adversário escolhido para ser batido for Bolsonaro. Isso é válido tanto do ponto de vista de conquista de votos quanto em relação à defesa de uma visão de mundo que é mais oposta ao bolsonarismo do que ao lulismo. Essa foi a lição que FHC, no alto dos seus quase 90 anos, deixou para os políticos mais ao centro.

Doutor em Ciência Política pela USP e Professor da FGV-EAESP