O Estado de S. Paulo, n. 46602, 21/05/2021. Política, p. A8
Bolsonaro afirma que Salles é 'excepcional'
André
Borges
Após um dia de silêncio, o presidente Jair Bolsonaro saiu em defesa do ministro
do Meio Ambiente, Ricardo Salles, sob suspeita de participar de esquema de
corrupção ligado à exportação ilegal de madeira. Bolsonaro disse em sua live
semanal nesta quinta-feira, 20, que Salles é um "excepcional
ministro" que enfrenta "dificuldades com setores aparelhados do
Ministério Público", que ele classificou como "xiitas
ambientais".
Alvo central da Operação Akuanduba, Salles conta com a blindagem não apenas de Bolsonaro e seus filhos, mas de empresários e do agronegócio. Sua permanência no cargo, no entanto, é questionada reservadamente pela ala militar do governo com gabinete dentro do Planalto. Um dos nomes cotados para substituí-lo é o do advogado Antônio Claret Júnior, diretor-geral na Agência Reguladora de Abastecimento de Água e Esgotamento Sanitário de MG.
As madereiras que são alvo da operação deflagrada pela Polícia Federal anteontem estão entre aquelas que mais realizaram transações internacionais.
O Estadão teve acesso a uma nota técnica do Ibama elaborada em agosto do ano passado, que traça um panorama nacional envolvendo o uso do Documento de Origem Florestal (DOF) em exportações. Esse documento é aquele que, desde fevereiro 2020, passou a ser o único utilizado pelas madeireiras para vender produtos a outros países, a partir de uma mudança nas regras publicada pelo presidente do Ibama, Eduardo Fortunato Bim. A alteração acabou com a necessidade de emitir uma autorização específica de exportação. Desde ontem, porém, por decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes, a autorização de exportação voltou a ser exigida.
O levantamento do Ibama, que reúne dados oficiais registrados Ibama entre 2007 e agosto de 2019, mostra que as duas empresas apontadas pela PF como aquelas que atuaram para liberar madeira apreendida nos Estados - a Ebata Produtos Florestais e a Tradelink Madeiras - estão entre as sete mais atuantes do Brasil. Nos treze anos analisados, a Ebata realizou nada menos que 5.484 transações de exportação de madeira, o que faz da empresa a quarta mais ativa no ranking nacional.
No mesmo período, a Tradelink fez 4.781 transações de exportação. Os dados históricos apontam que a madeireira que mais atua com exportações é a Mil Madeiras Preciosas, localizada em Itacoatiara, no Estado do Amazonas, com 12.705 transações entre 2007 e 2019. Esses dados referem-se a operações formais, ou seja, aquelas que foram devidamente informadas ao Ibama.
O mapeamento revela ainda que há uma forte concentração das exportações em poucas empresas do setor. O número total de madeireiras que realizaram alguma operação com outro país no período analisado chegou a 895 empresas. Deste total, porém, apenas 50 madeireiras foram responsáveis por quase metade de todas as transações históricas.
Como mostrou o Estadão, os sócios da Tradelink Madeiras, David Pereira Serfaty e o inglês Leon Robert Weich administram uma empresa que já se envolveu em problemas com a Justiça brasileira. Venda de madeira ilegal, falsificação de informações ambientais e exploração de trabalho escravo são alguns delas. As autuações à empresa, apontada como beneficiada por decisões do Ibama e do ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles, ultrapassam R$ 7 milhões, diz a PF.
A Tradelink informou que Leon Robert Weich é desconhecido na unidade de Ananindeua (PA), apesar de ter seu nome listado na relação societária. David Pereira Serfaty não foi localizado.
Tuíte. Ex-chefe da PF no Amazonas, Alexandre Saraiva tuitou sobre a Operação Akuanduba: " Cantem de alegria todas as árvores da floresta". O delegado caiu após atrito co Ricardo Salles.