O Estado de S. Paulo, n. 46579, 28/04/2021. Política, p. A8

Flávio aponta 'ingratidão' de Pacheco

Vinícius Valfré
Daniel Weterman


Com o presidente Jair Bolsonaro no alvo da CPI da Covid no Senado, governistas tentaram ontem reduzir os danos ao chefe do Executivo, mas provocaram atritos até mesmo com aliados. Embora não integre o grupo, o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) foi pessoalmente à reunião e, além de ataques ao relator da investigação, senador Renan Calheiros (MDB-AL), criticou o presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), a quem chamou de irresponsável e ingrato. O senador do DEM foi eleito para o comando da Casa, em fevereiro, com ajuda do Palácio do Planalto.

Para Flávio, Pacheco erra ao permitir trabalhos presenciais no Senado e será responsável por eventuais mortes de parlamentares e servidores. "Pacheco está sendo irresponsável, porque está assumindo a possibilidade de, durante os trabalhos desta CPI, acontecer morte de senadores, morte de assessores, morte de funcionários. Nem todos estão vacinados", disse o filho mais velho do presidente, que apareceu na reunião com uma tipoia ortopédica no braço direito (o senador sofreu um acidente de quadriciclo no Ceará na semana passada).

Pacheco foi contra a instalação da comissão, mas determinou a criação do colegiado após decisão do Supremo Tribunal Federal. Nos bastidores, Pacheco foi pressionado pelo Palácio do Planalto para adiar o funcionamento da CPI, mas, mesmo assim, deu aval para a investigação neste momento. Para atender governistas, o presidente do Senado aceitou ampliar o escopo da investigação, incluindo a apuração de repasse de verbas a Estados e municípios.

Flávio, porém, reclamou de "ingratidão" de Pacheco. "Eu tenho um CPF e o presidente da República tem outro. Da minha parte, entendo, sim, que houve uma ingratidão, uma falta de consideração por parte do presidente (Pacheco)", disse, em entrevista no Senado. Na avaliação de aliados de Pacheco, as declarações do filho do presidente não representam um rompimento e atribuem a acusações ao clima acirrado da CPI.

'Justiça aos mortos'. Outro integrante da tropa de choque de Bolsonaro na CPI, o senador Marcos Rogério (DEM-RO) bateu boca com o presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), ao afirmar que a comissão "não serve a esse propósito de fazer justiça aos mortos". Aziz, que é próximo ao governo, mas crítico da postura de Bolsonaro na pandemia, repreendeu o colega. "Não, presta-se, sim. Eu me presto, você se presta para isso", respondeu. Tanto o presidente da CPI quanto o relator da comissão afirmaram que a investigação vai chegar aos responsáveis pelo aumento no número de mortes no País.

A sessão de instalação dos trabalhos foi marcada por manobras frustradas de governistas. O principal objetivo era barrar Renan na relatoria. A estratégia foi de alegar parcialidade do emedebista, que é pai do governador de Alagoas, Renan Filho (MDB), e crítico do governo Bolsonaro.

Segundo Flávio, Renan não poderia ter assumido o posto porque já prejulgou a gestão do governo federal em pronunciamentos. "Essa antecipação de julgamento, sem nem acompanhar trabalho nenhum, sem colher prova de nada, sem ouvir ninguém, é uma clara demonstração de qual será o encaminhamento não só no relatório final, mas em todo o trabalho da CPI. Como filho do presidente, tenho bom senso. Eu não estaria na CPI. Entendo que não teria a imparcialidade", afirmou.