Correio Braziliense, n. 20756, 21/03/2020. Economia, p. 8

Governo admite quadro de recessão
Rosana Hessel
Marina Barbosa


Diante de um quadro cada vez mais crítico para a economia, devido ao impacto da pandemia do novo coronavírus, a equipe econômica realizou a segunda revisão do Produto Interno Bruto (PIB) no mês. Os novos dados, apresentados pelo secretário especial de Fazenda do Ministério da Economia, Waldery Rodrigues, preveem crescimento de apenas 0,02% em 2020.

Na semana passada, a estimativa havia sido reduzida de 2,4% para 2,1%. Ao apresentar as novas projeções, o governo reconheceu que o momento é preocupante. “Vimemos uma situação de especificidade no mundo todo. Já há estimativas de queda de 2% do PIB mundial. E o impacto sobre o Brasil também será em magnitudes expressivas”, disse Waldery, ao lado do secretário de Política Econômica, Adolfo Sachsida.

A nova projeção foi apresentada com o primeiro relatório bimestral de receitas e despesas do Orçamento de 2020. Ambos admitiram a possibilidade de o país entrar em recessão técnica no primeiro semestre, ou seja, com queda consecutiva do PIB por dois trimestres seguidos. “Existe uma boa chance de termos um PIB não muito favorável”, afirmou Sachsida.

Os dados do governo, no entanto, ainda são considerados otimistas por analistas do mercado. A economista Alessandra Ribeiro, sócia da Tendências Consultoria, acaba de alterar as estimativas para o PIB deste ano, passando de um crescimento de 1,6% para uma queda de 1,4%. Contudo, não descarta a possibilidade de o PIB encolher ainda mais. “Nosso cenário pessimista é de retração de 3,3%”, adiantou.

Levantamento da Fundação Getulio Vargas de São Paulo (FGV-SP) prevê que o PIB poderá encolher 4,4%, em um cenário pessimista. “Com certeza vamos ter uma recessão e essa previsão é um dado conservador se o governo não conseguir controlar logo a pandemia”, alertou o coordenador do estudo, o professor Ernesto Marçal. “O custo pode ser alto agora, mas, em termos de perda de PIB, o prejuízo poderá ser muito maior”, complementou.

Além de prever um PIB praticamente zerado, o governo reduziu de 3,12% para 3,05% a previsão para a inflação oficial, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Valor acima das novas estimativas dos analistas, de 2,5%, devido à desaceleração da atividade e da queda brusca na demanda. O governo ainda tem uma estimativa elevada para o barril do petróleo, de US$ 41,87. Antes era US$ 52,70.

Questionado se os dados oficiais não estão superestimados, distorcendo a previsão de receita ao longo do ano, Sachsida justificou: “Trabalhamos com os números que temos em mão, da forma mais cautelosa possível, e assim continuamos”.

Apesar de o Congresso ter dado aval para que não se cumpra a meta fiscal deste ano, aprovando o estado de calamidade, Waldery disse que a previsão atualizada de resultado primário das contas públicas será divulgada posteriormente, antes da publicação do segundo relatório de despesas, em 22 de maio. Ele reforçou que a regra de ouro e o teto de gastos serão cumpridos.

A meta fiscal prevista na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) permitia um deficit de até R$ 124,1 bilhões. Pelas estimativas do governo, que consideravam um crescimento do PIB de 2,1%, o deficit primário seria de R$ 161,6 bilhões. Waldery não antecipou a nova meta, mas sinalizou que ela poderá ficar “perto de R$ 200 bilhões”. Para Alessandra, da Tendências, há chances de o rombo ultrapassar R$ 250 bilhões neste ano. Sachsida afirmou que é preciso ter controle dos gastos públicos, apesar do estado de calamidade. “Não podemos transformar um choque transitório em permanente”, disse.