Correio Braziliense, n. 20754, 19/03/2020. Política, p. 5

Brasília e capitais retomam panelaço


Pelo segundo dia consecutivo, o presidente Jair Bolsonaro foi alvo de protesto. Ao menos três séries de panelaços foram registradas em cidades brasileiras na noite de ontem. Os protestos estavam marcados para as 20h30, mas a primeira leva começou por volta das 19h, no início da entrevista coletiva no Palácio Planalto da qual participaram Bolsonaro, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, e outras autoridades.

Nas redes sociais, foram postados vídeos de panelaço e de gritos de “fora, Bolsonaro” e “fora, fascista” em capitais como Brasília, Goiânia, São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Porto Alegre, Salvador, Recife, Belém e Fortaleza. Os primeiros gritos de protesto puderam ser ouvidos enquanto as autoridades anunciavam a criação de um comitê nacional para enfrentar o novo coronavírus no Brasil.

Moradores de Águas Claras, Asa Norte, Asa Sul, Sobradinho e Sudoeste bateram panelas durante a entrevista do presidente sobre ações do governo contra o avanço do novo coronavírus no país. No Sudoeste, o panelaço foi acompanhado de barulho de vuvuzela, buzina e fogos de artifício.

À medida que as declarações eram transmitidas pela televisão, as manifestações ganhavam força. Uma nova leva de panelaços começou às 20h, nas mesmas cidades. Depois, às 20h30, começou a terceira série de manifestações, essa convocada desde ontem via mensagens de redes sociais. Em todos, houve gritos de “fora” dirigidos ao presidente. Em São Paulo, houve ainda registros de “buzinaço” de motoristas, acender e apagar de luzes e projeções de imagens e frases contra o chefe do Planalto em prédios.

Pró-Bolsonaro  

Questionado na coletiva sobre os protestos, o presidente classificou o panelaço contra seu governo como um movimento “espontâneo”. “Qualquer movimento por parte da população, eu encaro como expressão da democracia”, afirmou. Também ontem, às 21h, foram registradas manifestações pró-Bolsonaro em São Paulo, Rio e outras cidades, porém mais tímidas do que os protestos contra o governo. O panelaço favorável foi divulgado horas antes pelo próprio presidente, durante a coletiva. “Nós, políticos, devemos entender como uma pura manifestação da democracia”, declarou, ao pedir isenção da mídia na cobertura dos dois atos.

No Twitter,  Bolsonaro ainda reforçou a mensagem. “A TV Globo divulgou esse movimento do panelaço, bem como a Veja Online. Mas não vi esses órgãos da imprensa falando que corre nas mídias sociais um panelaço às 21h favorável ao governo Jair Bolsonaro”, disse.

Símbolo de protesto em países da América Latina, o panelaço marcou o segundo mandato da presidente Dilma Rousseff. A primeira manifestação do gênero foi registrada em 8 de março de 2015, no Dia da Mulher, e repetida diversas outras vezes. O último panelaço expressivo comemorou a aprovação do processo de impeachment da petista, em abril de 2016.

Embaixador chinês exige retratação

O embaixador da China no Brasil, Yang Wanming, usou as redes sociais ontem para exigir retratação do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), que culpa o país oriental pela pandemia do novo coronavírus. “As suas palavras são um insulto maléfico contra a China e o povo chinês”, disse o embaixador. Eduardo Bolsonaro acusou o governo de Xi Jinping de esconder a epidemia. “Substitua a usina nuclear pelo coronavírus e a ditadura soviética pela chinesa. Mais uma vez uma ditadura preferiu esconder algo grave a expor tendo desgaste, mas que salvaria inúmeras vidas. A culpa é da China e liberdade seria a solução”, escreveu o parlamentar, que preside a Comissão de Relações Exteriores da Câmara dos Deputados. O perfil oficial da embaixada chinesa também protestou contra o filho do presidente, fazendo referência ao governo de Donald Trump: “As suas palavras são extremamente irresponsáveis e nos soam familiares. Não deixam de ser uma imitação dos seus queridos amigos. Ao voltar de Miami, contraiu, infelizmente, vírus mental, que está infectando a amizade entre os nossos povos”. A China é o principal parceiro comercial do Brasil.