Correio Braziliense, n. 20754, 19/03/2020. Política, p. 4

Câmara libera gastos do governo
Marina Barbosa
Sarah Teófilo


A Câmara aprovou, ontem, o decreto de estado de calamidade pública, que valerá até 31 de dezembro, em decorrência da pandemia do novo coronavírus. O texto, enviado ainda ontem pelo presidente Jair Bolsonaro, deve passar pelo Senado na próxima semana. O decreto abre um espaço fiscal para que o governo possa aplicar mais recursos no combate à Covid-19, uma vez que deixa a União livre para aumentar os gastos públicos, não precisando cumprir a meta fiscal, cujo deficit previsto para este ano é de R$ 124 bilhões. A medida, porém, não desobriga o governo de cumprir o teto de gastos e a regra de ouro.

A matéria passou por aprovação simbólica — quando não há o registro de voto de cada deputado federal. O plenário estava, inclusive, com poucos deputados, muitos com máscara e constantemente passando álcool em gel nas mãos. Nesse tipo de votação, o presidente da sessão pede apenas que os parlamentares a favor da matéria permaneçam como se encontram. Se alguém for contrário, deve se manifestar. Ao encerrar a votação, o presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou que “no diálogo é que o Brasil vai superar as suas crises e os seus obstáculos”. “Não com a raiva e com o radicalismo”, ressaltou.

Três emendas foram apresentadas, sendo duas do PSB. Uma delas deixava claro que o texto não autorizava o governo a decretar estado de defesa ou de sítio. “Nosso receio é que essa decretação seja má utilizada pelo presidente”, explicou o líder do partido na Casa, o deputado Alessandro Molon (RJ). Para solucionar a questão, o relator da matéria, Orlando Silva (PCdoB-SP), incluiu no texto a palavra “exclusivamente”, para que ficasse expresso que o decreto é para fins fiscais, e Molon retirou os destaques.

No Congresso, será criada uma comissão mista formada por seis deputados e seis senadores para observar os gastos e as medidas tomadas pelo governo. O texto enviado por Bolsonaro leva em consideração a situação de outros países que começaram a vivenciar a pandemia antes do Brasil.

O governo federal teria de fazer um contingenciamento de R$ 40 bilhões neste ano caso não decretasse estado de calamidade pública. O valor que seria contingenciado e, consequentemente, atrapalharia o trabalho de combate ao coronavírus, foi revelado ontem pelo ministro da Economia, Paulo Guedes.

“Haveria um contingenciamento de quase R$ 40 bilhões. Então, num momento em que a economia brasileira precisa de um esforço contracíclico, nós, sem espaço fiscal, teríamos que, ao contrário, agudizar a crise, contingenciando R$ 40 bilhões. Evidentemente, não é uma coisa razoável. Então, trocamos uma ideia com o presidente, pois a saúde dos brasileiros e a defesa dos empregos dos brasileiros está acima de outros interesses”, argumentou o ministro. Ele explicou os efeitos do estado de calamidade pública em coletiva de imprensa realizada ao lado de Bolsonaro, no Palácio do Planalto.

Guedes disse que a medida foi a “melhor resposta técnica” encontrada pelo governo para este momento em que as despesas públicas estão subindo em função do coronavírus e as receitas estão caindo, tanto por conta da desaceleração econômica provocada pela pandemia quanto pela queda dos preços internacionais do petróleo e pela expectativa de que a privatização da Eletrobras, que pode gerar R$ 16 bilhões para o governo, não aconteça mais neste ano.

Medidas

O governo já anunciou um pacote de R$ 147 bilhões para tentar mitigar os efeitos econômicos do coronavírus por meio de medidas, como a ampliação do Bolsa Família, a antecipação do 13º salário dos aposentados e pensionistas do INSS, a antecipação do abono salarial e o adiamento do pagamento de impostos. Além disso, repassou mais R$ 9,5 milhões para o Ministério da Saúde dar seguimento aos esforços de contenção da doença.

Mas, segundo Guedes, novas medidas poderão ser anunciadas com o estado de calamidade. “O que fizemos foi diferimento de imposto e antecipação. Não atingimos ainda o fiscal. Agora, o fiscal é permitido. Temos espaço fiscal. Então, temos mais munição. Do ponto de vista de crédito, sabemos que podemos ampliar bastante”, afirmou. “Do ponto de vista de recursos, podemos gastar mais para a saúde e depois para atenuar os impactos nos setores. Podemos considerar, por exemplo, derrubar os encargos trabalhistas, o que aumenta brutalmente a capacidade de geração de empregos.”

Alcolumbre está com a doença

O presidente do Congresso, Davi Alcolumbre (DEM-AP), testou positivo para coronavírus. A assessoria do senador confirmou a informação, e disse que ele passa bem. O parlamentar havia feito o exame na terça-feira, com resultado negativo. “Davi Alcolumbre, no entanto, está bem, sem sintomas severos, salvo alguma indisposição, e segue em isolamento domiciliar, conforme determina o protocolo de conduta do Ministério da Saúde e a OMS (Organização Mundial da Saúde)”, informou a equipe de Alcolumbre. Na segunda-feira, ele se reuniu com os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, e com o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, além de outras autoridades.