O Globo, n. 31599, 11/02/2020. Mundo, p. 21

Batalha em New Hampshire

Camila Zarur


Após um início confuso com o caucus de Iowa, os candidatos democratas se enfrentam hoje na segunda prévia para decidir quem vai concorrer à Presidência dos Estados Unidos contra Donald Trump, em novembro. Os dois candidatos que chegam na frente para as primárias de New Hampshire — o senador Bernie Sanders e o ex-prefeito Pete Buttigieg — subiram o tom e protagonizaram uma troca de farpas durante o fim de semana. Os dois, que tiveram resultados muito próximos na primeira prévia, tentam aproveitar o momento e consolidar-se na liderança da disputa.

Buttigieg, que ficou em primeiro em Iowa e conquistou o maior número de delegados do estado, acusou o adversário de não ser honesto a respeito do custo de suas propostas, principalmente sobre a promessa de Sanders de criar um sistema público de saúde.

— O que podemos prescindir é de um plano tão caro que o próprio senador Sanders admite que ele não faz ideia de como será pago — atacou Buttigieg.

Por sua vez, Sanders questionou a credibilidade do exprefeito criticando o financiamento de sua campanha.

— Temos visões diferentes: Pete financiou sua campanha com contribuições de mais de 40 bilionários — disse o candidato durante um comício em Plymouth. Buttigieg rebateu, irônico:

— Bom, Bernie é bastante rico, e eu aceitaria com prazer dinheiro dele.

Líderes nas pesquisas

Além do embate entre os dois, os outros concorrentes também atacaram Sanders e Buttigieg. O ex-vice-presidente Joe Biden divulgou um vídeo comparando-se com o ex-prefeito. Na propaganda, a campanha de Biden diz que, enquanto o candidato mais novo instalava iluminação em uma ponte, o ex-vice ajudava a aprovar o “Obamacare”.

— O fato de Biden atacá-lo é porque sabe que o Buttigieg quer roubar votos de setores que seriam simpáticos ao ex-vice. Há uma disputa entre eles para saber quem vai conquistar a via moderada do partido — disse Carlos Gustavo Poggio, professor de Relações Internacionais da FAAP.

Apesar de Sanders e Buttigieg serem os principais alvos dos ataques, as críticas parecem não abalar a opinião do eleitorado de New Hampshire. Segundo a média das pesquisas feitas no estado, calculadas pelo site Real Clear Politics, o senador está na frente, com 28,7%, enquanto o ex-prefeito segue um pouco atrás, com 21,3%. Em terceiro aparece a senadora Amy Klobuchar, com 11,7%, que cresceu após ter um bom desempenho no último debate democrata, na sexta-feira. Biden e a senadora Elizabeth Warren vêm logo em seguida, com 11% cada.

No cenário nacional, a ordem dos candidatos se altera, mas Sanders continua na dianteira. Em duas pesquisas que englobam todo o país, o senador ficou na frente de Biden, até pouco tempo atrás o franco favorito. E, em outra surpresa, o ex-prefeito de Nova York Michael Bloomberg — que ainda não começou a disputar as primárias — ficou em terceiro nas duas enquetes.

Segundo a Universidade de Quinnipiac, que fez um dos levantamentos divulgados ontem, Sanders aparece em primeiro, com 25%, enquanto o ex-vice segue atrás, com 17%. Buttigieg está em quinto lugar, com 10% das intenções de voto. Antes dele, aparece Bloomberg (15%) e a senadora Elizabeth Warren (14%). Os números são parecidos com a pesquisa divulgada pela Reuters/Ipsos: Sanders em primeiro, com 20%, seguido de Biden, com 17%, e Bloomberg com 15%. Buttigieg registra 8%. Para Poggio, o senador é o nome consolidado para disputar a indicação do partido.

— A pergunta agora é quem é que vai concorrer contra Sanders. Ele consolidado na ala mais à esquerda do partido significa que Warren tem perdido relevância. O Sanders é o candidato antiestablishment, é o Trump dos Democratas em 2020. A questão é quem da outra ala disputará contra ele — disse Poggio.

As primárias de New Hampshire já começam com o fantasma do fiasco do caucus de Iowa, cujos resultados só foram divulgados dias após a prévia, devido a um problema com o aplicativo que contabilizaria a votação. Tanto Sanders quanto Buttigieg pediram revisão de algumas seções eleitorais. A previsão é que a primária de hoje seja mais tranquila, visto que o pleito será mais simples, com os votos sendo depositados em urnas.

Apelo aos independentes

Apesar de New Hampshire não se rum estado representativo para o restante dos EUA — com cerca de 1,3 milhão de habitantes cuja maioria é branca — sua primaria é importante pelo número de eleitores “independentes” que estão aptos a participarem da votação. Isso significa que o candidato democrata que conquistar esse eleitorado neutro evencera prévia estará chegando mais perto ao rótulo de candidato “mais viável” para concorrer contra Trump. Outro aspecto das primárias de New Hampshire é que elas começam a limpar o campo de candidatos, apontando os que têm menos chances.

— O eleitor democrata está buscando qual é o melhor para vencer o Trump. Os candidatos sabem disso, cada um deles vai tentar se provar o mais capaz de derrotar o atual presidente, em novembro — disse Poggio.

Orçamento de Trump tem cortes sociais e ambientais

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, divulgou ontem uma proposta de Orçamento de US$ 4,8 trilhões para o ano fiscal de 2021, que começa em outubro. O Orçamento proposto é um pouco maior do que os US$ 4,75 trilhões de 2020 e inclui uma lista de cortes na assistência financeira para estudantes, na construção de moradias populares, nos cupons de alimentação e no Medica id, o seguro de saúde público para pessoas muito pobres. A proposta reflete o esforço permanente do presidente de reduzirar e de de segurança proporcionada pelo Estado.

O Orçamento, que certamente sofrerá mudanças durante sua aprovação no Congresso, inclui gastos adicionais comas Forças Armadas, a defesa e a fiscalização das fronteiras, além de verbas para anova Força Espacial criada por Trump. Os cortes, de 2%, se concentram nos programas sociais e ambientais. Ele mantém o otimismo do presidente com o crescimento econômico do país, prevendo aumento de 3% do PIB em 2021 e nos anos seguintes.

O gasto total com defesa chegaria a US$ 740,5 bilhões, o maior do mundo e US$ 2 bilhões maior do que no Orçamento de 2020, com mais dinheiro para a modernização do arsenal nuclear e para pesquisas para a preparação dos militares para guerras do futuro.

Falando aos governadores em um evento na Casa Branca, Trump disse que sua proposta orçamentária aproximaria o déficit público de zero em "pouco tempo". O déficit chegou a US$ 1 trilhão em 2019.

A proposta de Orçamento contrasta bastante com os programas dos principais candidatos democratas à Presidência, que propõem aumento de impostos para os mais ricos e aumento dos gastos governamentais em educação e saúde.

O Orçamento de Trump se diferencia de suas propostas anteriores por não conter um plano explícito para substituir o Obamacare, o programa de ampliação de acesso a seguros de saúde aprovado durante o governo de Barack Obama.

O governo reservou alguns dos cortes mais profundos para a Agência de Proteção Ambiental, que teria uma redução de 26% no financiamento e a eliminação de 50 programas que Trump considerou "desperdício" ou duplicados.