Correio Braziliense, n. 21429, 17/11/2021. Política, p. 3

Bolsonaro promete reajuste a servidores

Cristiane Noberto


O presidente Jair Bolsonaro afirmou, ontem, que dará reajuste aos servidores públicos se o Senado aprovar a PEC dos Precatórios. O chefe do Executivo, no entanto, não especificou de quanto será o aumento. A menos de um ano das eleições, essa é mais uma medida que ele lança mão para tentar atrair votos. O reajuste, no entanto, é inviável dentro do Orçamento, segundo senadores.

“Há possibilidade (de reajuste), porque, com a inflação, estamos há dois anos sem aumento. A inflação chegou a dois dígitos (o IPCA acumula 10,67% em 12 meses). Então, conversei com Paulo Guedes (ministro da Economia). Passando a PEC dos Precatórios, tem de ter um pequeno espaço para dar algum reajuste”, ressaltou Bolsonaro, que está no Bahrein, em viagem oficial. “Não é o que eles merecem, mas é o que nós podemos dar. A todos os servidores federais, sem exceção.”

Em outro aceno ao funcionalismo, Bolsonaro disse que a reforma administrativa “não atingirá os atuais servidores”. Ele ainda destacou que só realizará os concursos públicos essenciais. “Dessa forma estamos mostrando responsabilidade”, explicou.

 

Cautela

As declarações de Bolsonaro, no entanto, são vistas com descrença entre servidores. Para Edvandir Felix de Paiva, presidente da Associação Nacional de Delegados de Polícia Federal (ADPF), apenas um reajuste não é suficiente, pois não há aumento real há anos. “Nós estamos sem recomposição inflacionária desde abril de 2016. As perdas são enormes”, afirmou. A categoria fez protetos, ontem, pelo Brasil (leia reportagem abaixo).

Segundo Gil Castello Branco, secretário-geral da Associação Contas Abertas, a intenção de Bolsonaro é um exemplo de dar com uma mão e tirar com a outra. Para o especialista, a “folga” no orçamento é praticamente inexistente, em se considerando as regras fiscais vigentes.

“Essas medidas sinalizam para o populismo fiscal às vésperas do ano eleitoral. O governo poderia cortar despesas discricionárias; reduzir subsídios; respeitar o teto de gastos, já considerando os precatórios do Fundef (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental) fora do teto de gastos; parcelar os precatórios dentro do que já prevê a Constituição; e negociar com o Congresso a redução do montante das emendas em vez de aumentá-las como já cogitam”, criticou. “A irresponsabilidade fiscal tem perna curta. As consequências ocorrem em cadeia: aumento do dólar, da inflação e dos juros; a retração dos investimentos; e o crescimento do desemprego.”

 

Prioridades

O líder do governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE), disse que o governo pode conceder reajuste aos servidores públicos, mas indicou que as “prioridades” serão discutidas no Orçamento. Senadores temem que o governo use o espaço fiscal de R$ 91,6 bilhões que se abrirá em caso de aprovação da PEC dos Precatórios para ampliar os salários do funcionalismo. Essa possibilidade foi acenada, inclusive, por Bolsonaro.

“O presidente sempre vai ter de escolher, porque as despesas discricionárias, as obrigatórias, estão muito apertadas. Como todos sabem, não ocorreram reajustes no serviço federal nos últimos três anos. Também votamos aqui o não reajuste para os governos estaduais nos anos da pandemia, ano passado e este ano, mas é possível, sim, conceder reajustes a partir do próximo ano”, sustentou Bezerra. “O que a gente entende, nas leituras que estamos fazendo, é que o espaço dentro do orçamento público está muito escasso, e as prioridades precisarão ser definidas quando da discussão da peça orçamentária, o que se dará até o final de dezembro.” (Com Agência Estado)
 

Policiais federais fazem protesto

Policiais federais de todo o país estão insatisfeitos com o governo Jair Bolsonaro e fizeram protestos ontem. A data escolhida não foi por acaso. Associações de delegados, peritos e agentes da PF aproveitaram o dia do policial federal e fizeram atos em Brasília e estados para cobrar  as promessas não cumpridas pelo Executivo e pedir mais valorização dos profissionais.

Em frente à sede da PF em Brasília, os representantes das entidades colocaram faixas com frases de protesto. O presidente da Federação Nacional dos Policiais Federais,  Luis Antônio Boudens, afirmou que as classes da polícia foram tratadas de maneiras diferentes por Bolsonaro. “Por que os militares não foram atingidos pelas reformas, enquanto os policiais perderam direitos?”, questionou.

Boudens defendeu que o momento é de pensar em união de todos os servidores da PF, independentemente do cargo. “Fizemos o dever de casa, mas precisamos nos manter unidos para garantir a preservação de nossos direitos”, frisou.

Está na mesa do chefe do Executivo uma proposta que reajusta o salário dos policiais federais, rodoviários federais e penais usando recursos da PEC dos Precatórios, em tramitação no Senado.

O presidente da Associação dos Delegados da Polícia Federal (ADPF), Edvandir Felix de Paiva, criticou a solução encontrada pelo Executivo. “Não deveríamos estar dependendo da PEC dos Precatórios para sermos valorizados. Quando o governo quer, ele encontra recursos para as suas prioridades. Se não encontrar para PF é porque a PF não é sua prioridade realmente”, enfatizou.

Eleito em 2018, Bolsonaro teve como uma das principais bandeiras a segurança pública e, com isso, ganhou a simpatia das classes policiais. “Se for apenas propaganda eleitoral, o governo estará demonstrando que o discurso de valorização da polícia não era para valer. Que valorização é essa que só causou perda de direitos e de salários?”, questionou Paiva.

Em nota coletiva, as entidades também se manifestaram. “Os policiais não têm motivos para comemoração”, disse o documento divulgado. “No ano passado, no mesmo dia 16 de novembro, o então ministro da Justiça e Segurança Pública, em nome do presidente da República, prometeu valorização e reconhecimento do trabalho prestado pelo policial federal. Um ano depois, nada de concreto foi efetivado.”

O documento foi assinado pela Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (ADPF); Associação Nacional dos Peritos Criminais Federais (APCF); Federação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (Fenadepol); Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef); e Sindicato dos Delegados de Polícia Federal (Sindepol).