O Globo, n. 31603, 15/02/2020. País, p. 12

Ministro admite ‘erro’ na interlocução com partidos

Entrevista: Luiz Eduardo Ramos


Sete meses à frente da articulação política do governo, o ministro Luiz Eduardo Ramos, da Secretaria de Governo, precisou da calmaria do recesso parlamentar de janeiro para reconsiderar a maneira como dialoga com o Congresso.

— Eu reconheço, e não tenho vergonha de falar, um dos erros foi que não tive interlocução com presidentes de partidos — afirmou Ramos, admitindo ter dado início a uma rodada de conversas com líderes das legendas, começando por aqueles do chamado centrão — entre os quais Ciro Nogueira, do PP, Gilberto Kassab, do PSD, e Marcos Pereira, do Republicanos —, contrariando uma das premissas de Bolsonaro no início de seu governo.

Ramos nega, no entanto, que o movimento seja a porta de entrada para a retomada do chamado presidencialismo de coalizão em busca da formação de uma base consolidada no Congresso. O ministro recebeu O GLOBO em seu gabinete no quarto andar do Planalto.

O senhor está mais confortável hoje para lidar e negociar com o Congresso?

Muito mais confortável. O cara começa a namorar e não pode avançar o sinal no segundo mês. O Rodrigo Maia, outro dia, me ligou, era um domingo e me chamou para ir à casa dele com a sua esposa comer uma pizza. São coisas que não tinham. Fomos no Rodrigo Maia mostrar os projetos importantes até junho. Fomos no Davi Alcolumbre. Eles estão com essa pauta. A Economia chegou hoje com a pauta dela. Coisa que eu não fiz ano passado. Eu cheguei aqui, era reforma da Previdência, não conseguia ver mais nada. Agora, não.

Nas conversas com presidentes de partidos o senhor tem feito um discurso de mea-culpa? De admitir que errou ao não se aproximar deles antes?

É verdade. Errei. Quem manda? É o presidente do partido. Tem que continuar falando com os líderes, é importante, me dou bem com todos. Agora, não é quem manda, o cara importante é o presidente do partido. Quem teria que falar com os líderes é o líder do governo, Major Vitor Hugo (PSL-GO).

O senhor fará um governo de presidencialismo de coalizão?

Não, não tem jeito. Vocês têm a prova maior: o Osmar Terra é do MDB. Ele saiu e o Onyx foi para lá. Qual é a coalizão? Seria coalizão se tirasse o Osmar Terra, mandasse o Onyx para a Câmara e colocasse o Wellington Roberto, líder do PL, para ser ministro. O discurso dele (Bolsonaro) não mudou. A prova é essa mudança, que não tem indicação política. Agora, eu reconheço, e não tenho vergonha de falar, um dos erros foi que não tive interlocução com presidentes de partidos. E estou tendo um retorno, surpreendentemente, positivo dos presidentes de partidos com quem tenho conversado. Não há nenhum pedido deles, nenhuma imposição minha, apenas precisamos dialogar.

Como ficou a promessa de liberar R$ 40 milhões de recursos para aprovar a reforma da Previdência?

Foi feita, dentro do previsto, uma previsão de créditos suplementares de acordo com o Orçamento. Não tem esse dinheiro para todo mundo, porque é um troço impossível R$ 40 milhões para cada parlamentar. Isso não aconteceu. Dentro do crédito suplementar, nós honramos algumas coisas dentro das políticas públicas. O toma lá, dá cá no passado era assim: o parlamentar pedia e o dinheiro saía. Não se sabia se tinha projeto, se a cidade precisava mesmo daquele hospital. Há até casos em que o cara pedia para fazer ponte em uma cidade que não tinha rio. Esse tipo de descontrole no governo Bolsonaro acabou. Para entender como são ligeiros: três horas após noticiarem a exoneração do presidente da Funasa, já tinha partido me ligando para indicar deputado ao cargo. Mas não é toma lá, dá cá. Senão eu mandaria exonerar todo mundo e vamos ver quem dá mais.

A relação com Onyx estava desgastada?

Eu e Onyx nos damos muito bem. Eu já não diria no segundo, terceiro escalão. Tinha gente de lá que vazava. Várias vezes eu fui lá no Onyx, a gente se abraçou.

Teremos mais mudanças ministeriais?

Nenhuma, esquece. Enfiem na cabeça que o ministro da Educação (Abraham Weintraub) não sai. O ministro da Educação sabe que tem o apoio do presidente. Marcelo Álvaro (Turismo) também continua, o presidente está muito satisfeito.

Como a morte do ex-policial Adriano da Nóbrega, assunto que envolve Flávio Bolsonaro, filho do presidente, tem respingado no governo?

O que eu sei é pela imprensa. O que causa apreensão é que iam queimar rapidamente o corpo e mandaram segurar. Consta que ele foi assassinado. A polícia está chegando, o cara levanta o braço, e mesmo assim atiram nele. Não há uma condenação efetiva. Agora, o presidente Bolsonaro tira foto com muita gente. Ele corre o risco porque já tirou mais de mil fotos. Não existe milícia. Há uma obsessão, não é o Flávio, não é o Carlos, é o presidente Bolsonaro. Uma pessoa da mídia me falou que a imprensa ainda não digeriu, após um ano que se passou, a vitória de Bolsonaro.