O Globo, n. 31593, 05/02/2020. País, p. 4

Investigado no Planalto
Bela Megale
Marco Grillo
Gustavo Maia


A Polícia Federal (PF) abriu um inquérito para investigar o titular da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República (Secom), Fabio Wajngarten. É a primeira vez no governo do presidente Jair Bolsonaro que um integrante do Palácio do Planalto passa a ser formalmente alvo de investigação. A abertura atendeu a um pedido do Ministério Federal (MPF) e o objetivo é apurar se o chefe da Secom praticou atos de corrupção passiva, peculato e advocacia administrativa à frente do cargo.

A abertura da investigação foi antecipada pela colunista Bela Megale, do GLOBO. As informações que deram origem ao inquérito foram reveladas no mês passado pelo jornal “Folha de S. Paulo”. A apuração ficará a cargo da Superintendência da PF em Brasília.

Wajngarten é sócio da FW Comunicação, empresa que tem contratos com emissoras de televisão (Band e Record) e agências de publicidade (Propeg, Artplan e Nova S/B) que recebem verbas do governo federal. A distribuição dessas verbas faz parte das atribuições do secretário como titular da Secom.

A legislação estabelece que fica configurado conflito de interesses quando é praticado “ato em benefício de interesse de pessoa jurídica de que participe o agente público, seu cônjuge, companheiro ou parentes, consanguíneos ou afins, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, e que possa ser por ele beneficiada ou influir em seus atos de gestão”. Uma das penalidades previstas é a demissão do cargo.

Respostas negativas

Ontem, reportagem da “Folha de S. Paulo” mostrou que Wajngarten não informou à Comissão de Ética da Presidência (CEP), ao ser nomeado para a Secom, que é sócio de uma empresa que tem relações comerciais com emissoras e agências destinatárias de verbas de publicidade do governo federal.

Ao assumir o posto, em abril do ano passado, Wajngarten foi questionado sobre participações societárias em companhias que atuam na área de competência do cargo dele e que poderiam gerar conflito de interesses.

O secretário respondeu negativamente a duas perguntas específicas: se “exerceu atividades econômicas ou profissionais, públicas ou privadas, nos 12 meses anteriores à ocupação do cargo, em área ou matéria afins às atribuições públicas, que possam gerar conflito de interesses” e se “nos 12 meses anteriores à posse no cargo, recebeu suporte financeiro de entidades privadas que desenvolvem atividade em área ou matéria afins às atribuições públicas, ou firmou acordos ou contratos com estas para recebimentos futuros, que possam gerar conflito de interesses”.

A declaração foi assinada por Wajngarten no dia 14 de maio e entregue à Comissão de Ética da Presidência da República. O procedimento é padrão para quem assume cargo no governo federal e tem objetivo de prevenir conflito de interesses.

Na comissão, a orientação nos bastidores é aguardar a resposta de Wajngarten ao pedido de informações enviado pelo relator dos processos contra o secretário, o conselheiro Gustavo do Vale Rocha — ex-ministro do governo Michel Temer e atual secretário de Justiça e Cidadania do Distrito Federal. Como o chefe da Secom dispõe de dez dias de prazo e foi notificado na semana passada, a resposta deve chegar nos próximos dias.

A próxima reunião do colegiado está marcada para o dia 19, quando o relator pode apresentar o seu parecer. Em reservado, um dos seis integrantes do colegiado disse ao GLOBO ter entendido que Wajngarten mentiu por ter dito que havia prestado todas as informações à CEP antes de assumir o cargo.

Há também um processo em andamento no Tribunal de Contas da União (TCU) que apura o suposto uso de critérios políticos, em detrimento de fatores técnicos, para a distribuição de verbas de publicidade para emissoras de televisão.

Outro lado

Em nota, Wajngarten afirmou que a abertura do inquérito é “mais um passo na rotina do processo de investigação solicitado” pelo MPF. Ele disse que terá a “oportunidade de provar” que não há irregularidades em sua gestão na Secom. Wajngarten acrescentou que não há qualquer relação entre a liberação de verbas de publicidade e os contratos da FW Comunicação, e disse ainda que se afastou da empresa “conforme a legislação determina” e que os contratos firmados por sua empresa foram anteriores a sua posse na Secom.