O Globo, n. 31592, 04/02/2020. Opinião, p. 2

É insuficiente a melhoria nas contas públicas


As estatísticas da economia brasileira têm melhorado, mas continuam a revelar a grande dimensão de uma crise que demora a ser deixada para trás. Na sexta-feira, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad), do IBGE, informou que o país chegou ao final do quarto trimestre de 2019, o último do ano, com uma taxa de desemprego de 11%, menos que os 11,8% do período de três meses imediatamente anteriores, sendo o mais baixo índice desde os 10,9% de março de 2016. Mas ainda há 11,6 milhões de pessoas em busca de emprego, 751 mil a menos do que em setembro.

Aplica-se a estes números a teoria do copo meio cheio e meio vazio: depende da maneira com que se observam os resultados. Se for acompanhada a evolução dos indicadores, constata-se que se firma a tendência de melhoria constante das estatísticas, embora de maneira lenta. O copo enche, mas devagar.

Outra questão a se examinar é como são compostos os bons resultados. Nas contas públicas, por exemplo, também há um quadro animador. Pela primeira vez desde 2014, há seis anos, quando a economia começou a mergulhar na mais grave recessão de que se tem notícia, a dívida pública não caía em relação ao PIB, indicador-chave para medir a capacidade de o Estado arcar com os compromissos financeiros. De 76,5% em dezembro de 2018, esta proporção retrocedeu para 75,8%, uma vitória da equipe econômica.

O Brasil ainda está distante dos índices de 50% a 60%, em média, das demais economias ditas emergentes. Aliás, a relação dívida/PIB do país se encontrava nesta faixa em 2014, mas a gestão Dilma (2011/16) radicalizou na heterodoxia. Não segurou os gastos, endividou crescentemente o Tesouro, a economia não reagiu, ao contrário, e uma grave crise fiscal se instalou.

O bom resultado das contas em 2018 — um déficit de R$ 61,8 bilhões, quando a meta era de R$ 132 bilhões —se deve a uma política fiscal responsável, como necessário, mas muito também a receitas extraordinárias, que não se repetirão. Uma delas, R$ 100 bilhões do dinheiro proveniente de endividamento público entregue ao BNDES, para subsidiar os “campeões nacionais”. Também não deu certo, e por isso o governo tem feito o banco devolver bilhões ao Tesouro.

Outra contribuição positiva às contas públicas é dada pela venda de dólares das reservas feita pelo Banco Central. Uma nova política adotada pelo BC nesta área.

Não se pode menosprezar este fato positivo, mas só mesmo quando a economia voltar a acumular superávits primários (exceto juros) constantes, com sucessivas reduções da relação dívida/PIB, a confiança dos investidores no país ganhará consistência. Não há, enfim, alternativa fora do prosseguimento do ajuste fiscal e das demais reformas.