O Globo, n. 31571, 14/01/2020. Economia, p. 18

Governo não descarta liquidação dos Correios

Jussara Soares


O governo não descarta a hipótese de liquidação total dos Correios, caso as demais possibilidades de privatização ou abertura de capital da estatal não se mostrem economicamente viáveis. A definição do futuro da instituição será dada por um parecer técnico que deverá estar pronto em outubro, quando será enviado para apreciação do presidente Jair Bolsonaro.

A liquidação é considerada mais remota, mas está entre as opções a serem estudadas. Apesar de Bolsonaro dizer que espera a privatização ainda neste ano, o governo estima que a empresa só entre no Plano Nacional de Desestatização (PND) em 2021.

Os estudos sobre o destino dos Correios, incluídos em agosto no Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), ainda não começaram. O termo de referência para que o BNDES contrate uma empresa para fazer a consultoria deve ser assinado ainda este mês, segundo técnicos. Pelo cronograma, o trabalho deve começar até abril.

A avaliação fará um levantamento sobre o modelo de negócios dos Correios, o que inclui avaliação do ambiente global do setor postal, tendências de mercado de mensagens e encomendas, sugestões de propostas legislativas, além de modelos de privatização de outros países.

Receita anual de R$ 18 bi

Os Correios detêm o monopólio constitucional apenas das correspondências, ou seja, a entrega de cartas, mensagens e telegramas. Com o avanço da tecnologia e o uso de meios digitais para a comunicação, o serviço está em declínio.

A receita anual dos Correios é de R$ 18 bilhões, dos quais 62% são gastos com o quadro de funcionários, o que inclui salários, encargos trabalhistas e pagamento de benefícios estabelecidos em acordos.

Dentro do governo, a desestatização dos Correios é considerada um tema sensível, principalmente pela quantidade de funcionários. Ao todo, a estatal tem cem mil servidores contratados pelo regime de CLT. A avaliação é que um Programa de Demissão Voluntária (PDV) é inócuo, pois mais da metade dos funcionários são carteiros, com baixa escolaridade e pouca mobilidade no mercado de trabalho.

A estatal tem um prejuízo acumulado de R$ 3 bilhões. De acordo com fontes da empresa, em 2019, cerca de R$ 300 milhões foram usados para abater dívidas. Com isso, o argumento é que a empresa não dá lucro e apenas opera no positivo.

Na semana passada, Bolsonaro, ao voltar a falar que deseja o quanto antes a privatização dos Correios, mencionou preocupação com o quadro de funcionários:

— Se pudesse privatizar hoje, privatizaria, mas não posso prejudicar o servidor dos Correios.

‘Demanda longa discussão’

O vice-presidente da Associação dos Profissionais dos Correios (Adcap), Marcos César Alves Silva, admite que o clima entre os funcionários não é bom e teme que o governo faça a desestatização de forma açodada. Ele lembra que são necessários estudos aprofundados e uma nova regulamentação do setor.

— Não dá para fazer de afogadilho. Esse processo demanda uma longa discussão.