O Globo, n. 31436, 01/09/2019. País, p. 12

Após prisões de Temer, memorial em sua homenagem é fechado
João Paulo Saconi


O pátio de uma faculdade de Direito em Itu, no interior de São Paulo, a 100 km da capital, abriga um memorial inacessível a alunos e pesquisadores. Nele, estão armazenados cerca de 75 mil itens que contam a história do expresidente Michel Temer (MDB), que inaugurou o espaço em dezembro passado.Depois de oito meses e de duas prisões do emedebista na Operação LavaJato, o espaço está fechado para visitação desde abril.

O Centro de Memória Michel Temer dispõe de três amplas salas de vidro em que é possível consultar informações sobre o homenageado. Elas estão fechadas e, do lado de fora, é possível ver apenas uma foto do ex-presidente e versos do poema “Nascimento e desejo”, escrito por ele. Há também duas grandes maquetes que representam construções de Brasília (o Estádio Mané Garrincha e o Palácio do Planalto, com direito a um Temer em miniatura). Ambas estão cobertas por panos pretos.

Em uma parede, completa a exposição a linha do tempo do político, iniciada com a certidão de nascimento expedida há 78 anos. O acesso a essa seção está vedado por cordões de isolamento desde que Temer foi preso, de acordo com alunos da Faculdade de Direito de Itu (Faditu).

— Depois que o Temer foi preso, colocaram panos em cima das maquetes e um cordão barrando a entrada. Não há obras no local e ninguém fala nada sobre — contou uma aluna. Na semana passada, O GLOBO esteve na instituição e encontrou o memorial fechado da maneira descrita pelos estudantes. O espaço fica localizado ao lado de um palco e diante da recepção e da biblioteca. Em placas indicativas, não consta o horário de funcionamento do centro. O mesmo ocorre no discurso dos funcionários.

— O memorial está fechado. Dá para tentar enviar um e-mail e solicitar acesso, mas atualmente não temos previsão de quando vai abrir novamente — sugeriu um dos responsáveis pela biblioteca da instituição. Após duas tentativas de contato, porém, não houve qualquer resposta com informações sobre a possibilidade de acessar e consultar o acervo de Temer.

Raízes paulistas

Natural de Tietê (SP), Temer se tornou professor assistente da Faditu em 1969, aos 28 anos. Especialista em Direito Constitucional, prosperou naquela comunidade acadêmica até se tornar diretor da faculdade, de onde só saiu após 15 anos de serviços prestados. As raízes com o interior paulista levaram Temer a transferir simbolicamente a capital do Brasil para Itu no feriado da Proclamação da República, em 15 de novembro de 2017, uma vez que o município sediou a primeira reunião republicana do país. Essa proximidade com Itu também fez com que Temer buscasse na cidade de 173 mil habitantes um refúgio para fugir dos holofotes após ter deixado a prisão pela primeira vez, em março.

Ele havia ficado quatro dias sob custódia da Polícia Federal. Suspeito de envolvimento em um esquema de corrupção na usina nuclear de Angra 3 (operada pela Eletronuclear), o ex-presidente alugou por duas semanas uma casa no condomínio mais luxuoso de Itu, o Terras de São José, longe da imprensa que cercava a casa dele no bairro Alto de Pinheiros, na capital paulista. Apesar da discrição, Temer voltou a ser preso em maio, por mais seis dias, até ser solto pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). A última visita de Temer ao memorial ocorreu enquanto ele esteva em Itu após a primeira prisão.

O diretor da Faditu, Mário Duarte, foi quem recebeu o ex-presidente, a quem se refere como “Michel” devido à amizade construída ao longo da carreira. Por telefone, Duarte negou à reportagem que o espaço tenha sido fechado após a prisão. Informou ainda que a área foi isolada apenas temporariamente para uma comemoração e que “não há nada de pano preto” atualmente. Ao saber que a reportagem havia visitado o local, mudou a justificativa para a vedação e o isolamento.

— Pode ter sido para evitar insolação. Mas o fechamento não tem a ver com a prisão. Temos uma relação amistosa com Michel e queremos até ampliar o espaço — justificou.