O Estado de S. Paulo, n. 46966, 20/05/2022. Espaço Aberto, p. A8

Compromisso com a agenda do saneamento

Luana Siewert Pretto


R$ 72,2 bilhões foi o total do compromisso assumido no Brasil em leilões e concessões, desde a aprovação do novo Marco Legal do Saneamento (Lei n.º 14.026/2020), valor animador para o setor que avança lentamente nos indicadores de acesso no País há décadas. A nova lei federal tem o objetivo de universalizar e qualificar a prestação dos serviços de saneamento, além de estabelecer a meta de alcançar a universalização até 2033, garantindo que 99% da população brasileira tenha acesso à água potável e 90%, ao tratamento e à coleta de esgoto.

Estes primeiros passos trazem um pouco de esperança diante de quase 35 milhões de brasileiros sem água potável e 100 milhões sem coleta e tratamento de esgotos. É o que os novos dados lançados pelo Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (Snis) anobase 2020 demonstram. Diante de uma das maiores pandemias da História, ficou mais evidente que, mesmo em 2020, grande parte da população não tinha água sequer para lavar as mãos.

Diante do cenário desafiador e de mudanças no saneamento, em fevereiro deste ano eu assumi a posição de presidente executiva do Instituto Trata Brasil, para que possamos continuar o trabalho de ser um instrumento de promoção do saneamento no Brasil por meio dos estudos e projetos sociais, sobretudo levando informação para a sociedade brasileira. Prestes a completar 15 anos de existência, o Instituto Trata Brasil se consolidou como uma das vozes na luta pelo acesso à água tratada e a coleta e tratamento do esgoto. As gestões executivas de Raul Pinho e Édison Carlos aproximaram o instituto de discussões-chave para a sociedade brasileira, principalmente na construção do novo Marco Legal do Saneamento.

Com a aprovação do marco, abrem-se oportunidades para envolver mais a sociedade brasileira nas discussões sobre a expansão e fiscalização da prestação dos serviços de água e esgotamento sanitário. O Instituto Trata Brasil publicou, em fevereiro de 2022, um relatório, ao lado da KPMG e da Manesco, que joga luz sobre o papel do cidadão na contribuição de uma regulação do saneamento mais eficiente. Ainda que a existência das agências reguladoras de saneamento date da Lei de Diretrizes de Saneamento Básico (Lei n.º 11.445/2007), já temos um histórico de bons exemplos no setor para que as demais agências infranacionais (estaduais, municipais e regionais) possam trilhar uma regulação inclusiva. Sem esforços em conjuntos, qualquer regulação na infraestrutura tende a ser fragilizada e ineficiente. Para que tenhamos um acesso equitativo, é necessário envolver a sociedade brasileira em todos os níveis de discussões.

À medida que o Brasil faz este compromisso consigo mesmo para que se alcance o acesso universal ao saneamento por meio do novo marco legal, chego ao Instituto Trata Brasil com uma proposta de estar ainda mais vigilante sobre o novo momento, sobretudo no que tange aos decretos e as normas propostos pelo governo federal. Aqui, cito dois pontos relevantes discutidos recentemente: a comprovação de capacidade econômico-financeira pelas empresas estatais; e a formação dos blocos regionais nos Estados, objetos estes revisados no novo Decreto n.º 11.030/2022, alterando o Decreto n.º 10.588/2020.

No novo decreto, o governo federal reviu algumas dessas regras com o objetivo de que os Estados e municípios se adaptem o quanto antes ao novo Marco Legal do Saneamento. Como exemplo, mesmo com o prazo para a comprovação da capacidade econômico-financeira dos prestadores terminado em 31 de março, o decreto estabeleceu um período de transição para a regularização dos contratos de prestação dos serviços. Entendo que o novo Marco Legal do Saneamento mantém sua premissa de pensar num Brasil para a frente em relação ao saneamento básico, sublinhando os compromissos entre os entes titulares e os operadores, para que a população tenha acesso aos serviços de maneira eficiente e o mais breve possível.

Reitero um posicionamento do próprio Instituto Trata Brasil, e que também adoto desde sempre por onde passo: temos de pensar no saneamento do presente e do futuro levando em consideração as lições aprendidas até aqui. Temos uma oportunidade de ouro de revolucionar o saneamento no Brasil, dando oportunidades para as empresas públicas se aperfeiçoarem e, também, para a iniciativa privada poder investir e atuar mais de perto. Temos metas internas no País, mas também objetivos internacionais para cumprir; não nos esqueçamos dos compromissos firmados na ONU quando assinamos os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), entre eles o ODS 6: garantir água potável e saneamento para todos até 2030.

Portanto, buscaremos esforços multilaterais para um acesso ao saneamento básico equânime e dentro das novas regras impostas. O Instituto Trata Brasil reafirma o compromisso com a sociedade brasileira para que se leve o acesso à água potável e à coleta e tratamento do esgoto a todos(as). Nossos objetivos sempre estarão atrelados aos anseios dos(as) brasileiros(as), sobretudo aos mais vulneráveis que ainda vivem sem os serviços essenciais em sua casa.

Presidente Executiva do Instituto Trata Brasil