O Globo, n. 31437, 02/09/2019. Sociedade, p. 21

Amazônia tem pior agosto em nove anos
Leandro Prazeres
Evelin Azevedo


Agosto deste ano foi o pior mês para a Amazônia desde 2010. O número de queimadas na região triplicou em relação a agosto do ano passado, passando de 10.421 em 2018 para 30.901 em 2019. O recorde anterior, há nove anos, foi de 45.018 focos de incêndio na parte brasileira do bioma. Os dados são do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).

Especialistas ouvidos pelo GLOBO foram unânimes em descartar fatores naturais como as causas desse aumento. Para eles, o crescimento no número de incêndios registrado no mês passado é resultado da ação humana e está diretamente ligado ao aumento nas taxas de desmatamento. A preocupação dos ambientalistas é com o mês que começa agora, já que setembro, mais seco, é historicamente pior para as queimadas do que agosto.

Dados do Sistema de Alerta de Desmatamento (SAD) do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) indicam que o desmatamento aumentou 15% entre agosto de 2018 e julho de 2019. Na comparação entre julho de 2018 e o mesmo mês de 2019, a taxa de desmatamento aumentou 66%. Para os especialistas, o aumento na derrubada de florestas fornece o combustível necessário para os incêndios.

— O número de queimadas representa o número do desmatamento na Amazônia. A floresta é úmida, e por isso não tem a característica de autocombustão. Só pega fogo a área que está seca, ou seja, nas regiões nas quais as árvores foram cortadas e deixadas para secar — diz Carlos Bocuhy, presidente do Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental (Proam).

Bocuhy afirma que, apesar da pressão internacional e do anúncio de medidas como o embargo às queimadas na Amazônia decretado pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL) na semana passada, ainda não é possível avaliar o impacto dessas ações:

— Ainda não consegui fazer uma avaliação para dizer se a estratégia adotada pelo governo é suficiente para diminuir os focos de incêndio. A tendência é que, diante da inação, a quantidade de focos aumente, porque há áreas que já foram desmatadas e precisam ser “limpas”, e setembro não será um mês isolado, mas um concatenamento de tudo o que aconteceu antes.

Combustível na floresta

A preocupação é semelhante à do engenheiro florestal Tasso Azevedo, idealizador do MapBiomas, programa independente de monitoramento do solo via satélite. Azevedo afirma que a apreensão com o mês de setembro é grande tanto pela característica mais seca deste mês quanto pela maior disponibilidade de combustível para as queimadas deixada pelo desmatamento nos meses anteriores.

Historicamente, a média de queimadas na Amazônia em setembro é a maior do ano. Em 2018, por exemplo, setembro teve mais que o dobro de incêndios que agosto: foram 24,8 mil focos contra 10,4 mil.

— Tem potencial para ser um mês muito ruim, porque tem muita matéria orgânica seca. Como houve aumento no desmatamento em julho, também há indicativo de que isso aconteceu em agosto, tem muito material disponível para queimar. Agora, vai depender muito de como as ações que o governo anunciou serão implementadas — afirma Azevedo.

Procurados, o Ministério do Meio Ambiente e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) não se pronunciaram até a conclusão desta edição.

Maioria quer Brasil no comando da floresta, diz pesquisa

> Levantamento do Datafolha divulgado pela “Folha de S.Paulo” aponta que 75% dos brasileiros acham que a Amazônia deve ser “totalmente administrada pelo Brasil”

> Enquanto 40% desses gostariam que o país comandasse o território amazônico de acordo “apenas com o interesse do país”, 35% concordam que o Brasil deveria “ouvir governos e entidades internacionais”

> Para 75% dos ouvidos, o interesse dos estrangeiros sobre a floresta é legítimo