O Globo, n. 31445, 10/09/2019. Rio, p. 12

Caso Marielle: PF vê indícios de briga eleitoral por trás do crime
Chico Otavio
Vera Araújo


Uma disputa por redutos eleitorais estaria por trás da suspeita de um possível envolvimento do conselheiro afastado do Tribunal de Contas do Estado (TCE- RJ) Domingos Inácio Brazão no assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL) e do motorista Anderson Gomes, em março de 2018. A informação consta do relatório sigiloso de 600 páginas em que se baseia o inquérito da Polícia Federal que apura eventuais obstruções à investigação do caso. No documento, Brazão é citado como “o principal suspeito de ser o autor intelectual” do crime.

Ao se apresentar à polícia para dizer que tinha informações sobre um plano de assassinato de Marielle, o sargento da PM Rodrigo Jorge Ferreira, ex-integrante de uma milícia, afirmou que o vereador Marcello Siciliano (PHS-RJ) queria a morte da colega por conta de uma guerra política. A PF, no entanto, verificou que não havia disputa de votos entre os dois. Por ou tralado, investigadores concluíram que Brazão e Siciliano tinham bases eleitorais nas mesmas regiões.

Siciliano teve expressiva votação nos bairros de Vargem Grande, Vargem Pequena, Recreio, Barra e Camorim. Trata-se de uma região que também é reduto eleitoral da família Brazão .“A mesma análise dá conta de outra disputa territorial: observou-se proximidade entre as zonas eleitorais onde Marielle Franco e Chiquinho Brazão (irmão mais velho de Domingos) obtiveram maioria de votos”, diz um trecho do relatório da PF. De acordo com um mapa que investigadores reproduziram no documento, essa região seria a da Barra.

O relatório da Polícia Federal aponta ainda que o nome de Brazão aparece numa troca de mensagens de celular entre Rodrigo Jorge Ferreira e sua advogada, Camila Moreira. A dupla teria engendrado uma trama para apontar Siciliano e o miliciano Orlando Oliveira de Araújo, o Orlando de Curicica, como autores do assassinato. Ferreira admitiu a agentes federais que inventou a história para tentar incriminar Siciliano e Orlando.

No trecho mais assertivo do relatório contra Brazão, o delegado Leandro Almada afirma que “Domingos Inácio Brazão é, efetivamente, por outros dados e informações que dispomos, o principal suspeito de ser o autor intelectual dos crimes contra Marielle e Anderson, o que deve ser objeto de criteriosa investigação por quem de direito”. No entanto, a PF ressalta que não há provas de que Ferreira tenha sido “plantado” por Brazão no inquérito da Polícia Civil.

Brazão, Siciliano e Orlando já negaram, em depoimentos a policiais e entrevistas, envolvimento no assassinato de Marielle e Anderson.