O Globo, n. 31496, 31/10/2019. País, p. 5

Bolsonaro culpa Witzel, que cita ‘descontrole’

Paulo Cappelli
Gustavo Goulart


Já estremecida, a relação entre o presidente Jair Bolsonaro e o governador do Rio, Wilson Witzel, piorou ontem. Enquanto o presidente acusou Witzel de, “criminosamente”, tentar comprometê-lo ao vazar informações em sigilo da investigação sobre o assassinato da vereadora Marielle Franco, o governador rebateu sugerindo que Bolsonaro teria tido um momento de “descontrole emocional” e que deveria “pedir desculpas ao povo do Rio”.

Em entrevista ontem em Riad, na Arábia Saudita, Bolsonaro se disse surpreso que um delegado tenha inventado, segundo ele, um depoimento para prejudicá-lo e voltou a criticar Witzel.

— Nos surpreende a qualquer um a Polícia Civil, o delegado que tá fazendo o inquérito, ignorar isso e inventar um depoimento, no meu entender, por ordem e determinação do senhor governador Witzel para tentar me prejudicar — afirmou o presidente.

— No meu entender, é uso político por parte do governador Witzel, que agiu criminosamente. Não só conduzindo para onde queria o inquérito, bem como tendo acesso a um processo que tramitava em segredo de Justiça. Um ato criminoso do governador do Rio que tem ambições políticas. Mas como não tem competência para aparecer no Brasil, acaba atacando o atual presidente da República.

Wilson Witzel reagiu:

— Eu tenho 17 anos como magistrado. E em toda a minha carreira como magistrado eu sempre prezei pelos princípios constitucionais. Jamais vazei qualquer tipo de informação, seja como magistrado, seja como governador. Lamento que o presidente tenha, num momento, talvez, de descontrole emocional, num momento em que ele está numa viagem, não está talvez no seu estado normal, tenha feito acusações sobre a minha atividade como governador.

Em resposta ao presidente, a Polícia Civil do Rio de Janeiro divulgou uma nota rebatendo as acusações: “O governador Wilson Witzel não interfere na apuração dos homicídios de Marielle e Anderson nem teve acesso aos documentos do procedimento investigativo, assim como em quaisquer outras investigações”.

Em setembro, Bolsonaro determinou o rompimento do PSL com o governo Witzel na Assembleia Legislativa. Na ocasião, o presidente usou uma rede social para negar que tivesse dado a ordem para a ruptura e atribuiu a decisão ao filho e senador Flávio, que comanda a sigla no Rio. A tensão entre os dois vem do projeto de Witzel de disputar o Planalto contra Bolsonaro em 2022, o que o próprio governador já afirmou abertamente em entrevistas, irritando o presidente.