O Globo, n.31.575, 18/01/2020. País. p.06

Investigação de caixa dois de Onyx está travada
Aguirre Talento 

 

Onyx. Ministro-chefe da Casa Civil no Palácio do Planalto: defesa conseguiu protelar andamento de ação no Supremo
Uma investigação sobre o pagamento de caixa dois do grupo J&F ao ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni (DEMRS), está travada no Supremo Tribunal Federal (STF) desde fevereiro do ano passado e até hoje não teve início, apesar de o próprio ministro ter admitido o recebimento de recursos para campanha fora da contabilidade oficial.

Por decisão do relator no STF, ministro Marco Aurélio Mello, o caso deveria ter sido remetido para a Justiça Eleitoral do Rio Grande do Sul, mas a defesa de Onyx apresentou recurso, até hoje ainda não julgado. O crime de caixa dois, tipificado como "falsidade ideológica eleitoral", prevê pena de até cinco anos de reclusão.

Em maio de 2017, quando a delação dos executivos da J&F, dona da JBS, veio a público, Onyx admitiu ter recebido R$ 100 mil não declarados à Justiça Eleitoral para abastecer sua campanha em 2014 e pediu desculpas pelo episódio. Na delação, porém, a J&F informou que o caixa dois de 2014 a ele foi de R$ 200 mil e que, em 2012, foram repassados outros R$ 100 mil ao deputado. Onyx, na ocasião, disse que iria ao Judiciário admitir a culpa.

—Estou assumindo aqui, como um homem tem que fazer, (usei os recursos) sem a declaração na prestação de contas. Todos os outros recursos foram 100% contabilizados, foi apenas este recurso. Eu quero pedir desculpas aos eleitores do Rio Grande do Sul que confiam em mim pelo erro que cometi, mas vou assumir, como um homem tem que fazer. Eu vou lá pra frente do Ministério Público, vou reafirmar o que estou dizendo publicamente aqui, vou ao juiz que foi destinado ao caso e vou reafirmar — disse Onyx, em uma entrevista em maio de 2017.

RECURSO NO STF

Contudo, a defesa atuou para que o ministro não concretizasse aquilo que tinha anunciado. Em 18 de fevereiro do ano passado, a então procuradora-geral da República, Raquel Dodge, solicitou ao ministro Marco Aurélio Mello a remessa do caso para a Justiça Eleitoral do Rio Grande do Sul. Dodge argumentou que os dois pagamentos de caixa dois da JBS a Onyx, em 2012 e em 2014, ocorreram no exercício do mandato de deputado federal, mas que, como ele não ocupa mais este cargo, o caso deveria ir para a Justiça Eleitoral gaúcha.

Dois dias depois, Marco Aurélio concordou com o pedido da ProcuradoriaGeral da República e autorizou a transferência da ação. O ministro se baseou na atual regra do foro privilegiado, que só permite a continuidade do processo na Corte se o fato tiver ocorrido no cargo atual, em decorrência do mandato.

A defesa de Onyx, porém, apresentou um recurso, conhecido como "agravo de instrumento". Na peça, o advogado Adão Paiani argumentou que Onyx estava licenciado do cargo de deputado federal, mas foi eleito para este mandato e, por isso, deveria preservar o foro privilegiado, já que o suposto crime de caixa dois teria ocorrido em função do mandato parlamentar.

Por causa da apresentação do agravo de instrumento em março, a questão precisaria ser levada para julgamento na Primeira Turma do STF. Em casos do tipo envolvendo processos da Lava-Jato, o relator Edson Fachin costuma manter o envio das investigações para a primeira instância enquanto o STF não julga o recurso — dessa forma, a investigação continua em andamento até que o recurso seja julgado. Neste caso envolvendo Onyx, a investigação ficou totalmente paralisada, porque Marco Aurélio manteve o processo no Supremo até que a Primeira Turma chegasse a um entendimento. Segundo advogados ouvidos pelo GLOBO, cada ministro pode ter um entendimento diferente sobre a paralisação ou continuidade de investigações em casos desse tipo. Além disso, o processo só foi colocado na pauta da Primeira Turma em 13 de agosto — e não foi julgado naquele dia. Após sucessivos adiamentos, o julgamento do recurso teve início em 26 de novembro. O relator Marco Aurélio votou contra o pedido da defesa de Onyx e a favor do envio imediato dos autos para a Justiça Eleitoral do Rio Grande do Sul. Essa definição, porém, foi interrompida porque o ministro Alexandre de Moraes pediu vista para analisar o caso. Moraes ainda não devolveu o processo. Com isso, até hoje o julgamento não foi retomado.

ONYX SE DEFENDE

A defesa de Onyx Lorenzoni afirmou em nota que aguarda "a regular tramitação do processo". "Aguardamos com tranquilidade a regular tramitação do processo perante a Primeira Turma do STF. A defesa entende o pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes como um indicativo da perfeita plausibilidade da tese de que cabe ao STF o processo e julgamento do feito, face a clara disposição constitucional adotada em situações análogas", afirmou o advogado Adão Paiani. A assessoria de imprensa da Casa Civil não respondeu aos questionamentos. Procurado por meio da assessoria do STF, o ministro Alexandre de Moraes afirmou que o caso "está em análise", sem dar uma previsão de quando será devolvido para a pauta da Primeira Turma. O ministro Marco Aurélio disse que não iria comentar o assunto.