O Estado de S. Paulo, n. 46947, 01/05/2022. Política, p. A7

Atos contra o Supremo levam às ruas tensão entre Poderes

Eduardo Laguna
Sandy  Oliveira
Iander  Porcella, 
Rubens ​Anater


 

Os protestos contra o Supremo Tribunal Federal (STF) e em defesa do deputado Daniel Silveira (PTB-RJ), marcados por bolsonaristas para hoje, espelharão nas ruas o clima de tensão entre os três Poderes da República que marcou a última semana. O presidente Jair Bolsonaro, cuja presença é esperada mas não foi confirmada, incentivou ontem seus apoiadores a participar das manifestações.

“Quero dizer a todos vocês que, por ventura, forem às ruas amanhã (hoje), não para protestar, mas para dizer que o Brasil está no caminho certo, que o Brasil quer que todos joguem dentro das quatro linhas da Constituição, e dizer que não abrimos mão da nossa liberdade”, disse o presidente, ao discursar na cerimônia de abertura da ExpoZebu, em Uberaba (MG).

Os protestos devem ocorrer em diversas cidades, com a participação de parlamentares bolsonaristas. Daniel Silveira, que recebeu perdão de Bolsonaro no dia 21 após ser condenado pelo Supremo a 8 anos e 9 meses de prisão por incitar agressões a ministros e atentar contra a democracia, é esperado no Rio e em São Paulo.

Em Brasília, o protesto – que pode ter a presença do presidente – será realizado em frente ao Congresso. Na capital paulista, os atos deste domingo também vão levar às ruas a polarização apontada pelas pesquisas de intenção de votos para a Presidência da República. O protesto bolsonarista acontece na Avenida Paulista.

A cerca de 3 km de distância, na Praça Charles Miller, centrais sindicais promovem o tradicional ato pelo Dia do Trabalhador, com a presença do expresidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O governo de São Paulo prepara um esquema com 840 policiais para garantir a segurança.

Entorno Aliados do presidente sugerem que ele não vá aos atos, mas veem reação imprevisível

Alerta. Aliados do presidente o aconselharam a não ir à manifestação, mas eles mesmos ponderam que Bolsonaro é imprevisível. A avaliação é de que o chefe do Executivo teve ganhos políticos ao confrontar o Supremo no caso Silveira, e agora é preciso baixar a temperatura da crise.

O temor é que haja uma repetição do que ocorreu no 7 de Setembro do ano passado. Na ocasião, Bolsonaro passou a semana anterior criticando ministros do STF. No dia 7, ao discursar nos atos, em Brasília e em São Paulo, xingou e fez ameaças aos ministros e disse que não iria cumprir decisões de Alexandre de Moraes, que é relator, na Corte, de processos que afetam o próprio presidente e aliados.

As declarações geraram forte reação no Legislativo e no Judiciário. Parlamentares e juristas viram crime de responsabilidade, que, se comprovado, resulta em impeachment. O presidente do STF, Luiz Fux, cancelou reunião marcada para aquela semana justamente para amenizar a tensão na cúpula dos três Poderes. Após a reação negativa, Bolsonaro divulgou uma Declaração à Nação, na qual recuava e dizia que não tinha “intenção de agredir quaisquer dos Poderes”.

Repetição. Os atos bolsonaristas deste 1º de Maio foram convocados em meio a uma nova escalada de enfrentamento aos ministros do STF e críticas à Justiça Eleitoral. Na quartafeira passada, em um ato “pela liberdade” no Palácio do Planalto, Bolsonaro voltou a criticar o STF e colocou novamente em suspeição a lisura das urnas eletrônicas. Na ocasião, sugeriu uma contagem de votos pelas Forças Armadas.

As declarações provocaram imediata reação dos presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e da Câmara, Arthur Lira (Proggressistas-AL), que divulgaram declarações públicas em defesa da democracia e do processo eleitoral.

No dia seguinte, quatro ministros do Supremo, todos com atuação recente no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), também se manifestaram em defesa das eleições e da Constituição. Anteontem, Bolsonaro ensaiou um recuo ao afirmar que não tem intenção de “peitar” o Supremo. Em seguida, reiterou críticas à Corte.