O Estado de S. Paulo, n. 46943, 27/04/2022. Política, p. A10

Embate entre Supremo e Bolsonaro deve frear inquérito das fake news

Weslley Galzo


O embate entre o presidente Jair Bolsonaro e o Supremo Tribunal Federal (STF) em razão do perdão concedido pelo chefe do Executivo ao deputado Daniel Silveira (PTB-RJ) tem o primeiro desdobramento político: a possibilidade de esvaziar o inquérito das fake news. Conduzida pelo ministro Alexandre de Moraes, a investigação já levou bolsonaristas à prisão e conteve aliados do presidente que usaram as redes para atacar instituições públicas, como o próprio STF. No Palácio do Planalto e na Corte, a avaliação é que o contexto político em ano eleitoral não abre espaço para novas ações que tenham como alvo os aliados de Bolsonaro.

A cúpula do governo comemora o decreto de perdão a Silveira, condenado a 8 anos e 9 meses de prisão, como um ato que, além de livrar o parlamentar aliado da cadeia, teria conseguido cercar o STF. Por isso, dizem não acreditar em novas medidas neste sentido.

Do lado da Corte, o episódio é considerado como mais um capítulo no discurso reincidente de Bolsonaro de prometer não cumprir decisões do STF, como já fizera no 7 de Setembro do ano passado. Ministros da Corte entendem que o presidente escolheu o STF como mote de discurso com intenção eleitoral clara.

Um ministro comentou que o governo parece querer adotar estratégia do "ganha-ganha". Ou seja, para cada ato da Corte que o contrariar ele pode contra-atacar com uma medida para enfrentar a decisão judicial. A disposição de parte dos integrantes do Tribunal é agir de forma institucionalmente unificada.

Aliados que assessoram a pré-campanha de Bolsonaro à reeleição dizem que têm relatórios de monitoramento indicando que bater no STF esquenta as redes e mantém ativos seus seguidores. Pesam nessa avaliação a associação que bolsonaristas fazem entre a imagem do Supremo e a decisão de ter liberado o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) dos processos da Lava Jato e, ao mesmo tempo, anulado sentenças proferidas pelo ex-juiz Sérgio Moro (União Brasil).

Observação. Um eventual esvaziamento do inquérito das fake news não significa, porém, que Moraes está impedido de agir ou deixará de fazê-lo quando considerar necessário para dar continuidade na investigação. No STF, entretanto, avalia-se que é mais prudente, no momento, evitar a adoção de medidas individuais de maior impacto que pudessem resultar em prisão ou outras medidas coercitivas contra bolsonaristas.

Um dos ministros disse, reservadamente, que a situação de crise em que a Corte se encontra demanda, por ora, "observação" em vez de ações.

Ontem, o presidente do STF, Luiz Fux, reuniu ministros da Corte para comemorar seu aniversário de 69 anos. Nas conversas, o perdão a Silveira e um pacto de silêncio. Ficou combinado ali que os ministros devem evitar falar sobre a crise entre os Poderes, para não esticar mais a corda da relação com o Palácio do Planalto.

Apuração

Investigação já levou bolsonaristas à prisão e atingiu aliados do presidente da República