Correio Braziliense, n. 21400, 19/10/2021. Cidades, p. 13

Três dias, duas mulheres mortas

Cibele Moreira
Edis Henrique Peres
Samara Schwingel


O Distrito Federal registrou, ontem, a 18ª vítima de feminicídio de 2021 — cinco a mais do que o contabilizado entre janeiro e outubro de 2020. Márcia Aparecida Bispo Duarte, 43 anos, morreu no Hospital de Base após 10 dias internada na unidade de terapia intensiva (UTI) devido às graves lesões na cabeça e na face. Ela foi brutalmente agredida com uma barra de ferro por um homem de apelido Fusquinha, marido da cunhada, Ivani Ferreira da Silva, 42, que também foi atingida pelo esposo e segue com sequelas, sem conseguir falar nem andar. O agressor está preso preventivamente pelos crimes de feminicídio, tentativa de feminicídio e agressão corporal contra a enteada de seis anos.

A irmã de Ivani e cunhada de Márcia, Geni Ferreira da Silva, 37, conta que tudo aconteceu muito rápido. “Eu fui no mercado, e vi minha irmã e a Márcia descendo para casa. O marido da minha irmã estava bebendo com o meu marido na rua detrás, quando ele falou que ia em casa e já voltava. Foi um tempo de 10 a 15 minutos que tudo aconteceu. Quando cheguei, encontrei as duas muito machucadas”, relata Geni. “Eu ainda estou sem acreditar”, desabafa. As agressões ocorreram em 9 de outubro, um sábado. A filha de Ivani estava no momento e viu tudo, além de ter sido atacada pelo padrasto, mas sem muita gravidade.

Márcia estava consciente quando Geni chegou à casa da irmã. Com grande ferimento na cabeça, ela relatou que foi agredida pelo marido da cunhada. Os vizinhos acionaram o Corpo de Bombeiros Militar do Distrito Federal (CBMDF), que apareceu no local aproximadamente uma hora depois, segundo Geni. O local onde o crime aconteceu é de difícil acesso, em uma região periférica de Sobradinho II, com várias ruas estreitas desniveladas e algumas de terra batida. Pela gravidade dos ferimentos, Márcia foi encaminhada direto para o Hospital de Base. Ivani foi transportada para o Hospital Regional de Sobradinho, onde passou por uma cirurgia e depois transferida para o Hospital de Base. Ela recebeu alta no último domingo.

De acordo com o delegado Laércio Carvalho, da 35ª Delegacia de Polícia (Sobradinho 2), responsável pela investigação do caso, o crime iniciou-se após uma discussão entre o casal. O autor tinha três passagens por Maria da Penha de outros relacionamentos e uma outra por porte ilegal de arma de fogo. Ele segue preso no Complexo Penitenciário da Papuda. Se condenado, pode pegar até 30 anos de reclusão.

Familiares de Ivani contam que ela pensava em se separar do marido, devido às recorrentes discussões entre o casal. “Inclusive, poucos dias antes das agressões, ela ligou três vezes para a polícia para reclamar sobre ele. E a polícia perguntou se ele a tinha agredido fisicamente, e ela falou que só com palavras. Ela ainda falou ‘eu tenho que morrer para vocês virem aqui’”, relembra Geni. Segundo ela, nenhum policial apareceu naquele dia.

“A polícia tem que dar mais atenção para esses casos. No dia que ela chamou, se eles tivessem aparecido, poderiam ter evitado essa tragédia”, ressalta Geni Ferreira. Ivani está sendo cuidada por familiares em uma casa no Goiás. Ela tem quatro filhos, sendo três já maiores de idade.

Márcia Aparecida, que frequentava pouco a casa de Ivani na Vila Rabelo II, deixa cinco filhos e um sobrinho com deficiência de quem ela cuidava, além do esposo com quem ela vivia em uma casinha bem simples na Vila Buritizinho, em Sobradinho II. Natural de Tocantins, Márcia era querida por todos que a conheciam. “Eu tenho um grande respeito por ela. É muito triste o que aconteceu. Sei o que a família dela está passando. E, se eles precisarem de qualquer ajuda para cuidar dos meninos dela, a gente vai ajudar”, reforça a cunhada, Geni.

 Onde pedir ajuda

• Central de Atendimento à Mulher em Situação de Violência — Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República

• Telefone: 180 (disque-denúncia)

• Centro de Atendimento à Mulher (Ceam)

• De segunda a sexta-feira, das 8h às 18h

• Locais: 102 Sul (Estação do Metrô), Ceilândia, Planaltina

• Delegacia Especial de Atendimento à Mulher (Deam)

• Entrequadra 204/205 Sul, Asa Sul

• (61) 3207-6172

• Disque 100 — Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos

• Telefone: 100

• Programa de Prevenção Orientado à Violência Doméstica e Familiar (Provid) da Polícia Militar

• Telefones: (61) 3910-1349 / (61) 3910-1350