O Globo, n.31.582, 25/01/2020. Editoriais. p.02

Bolsonaro ensaia romper com Moro

 

Um embate como este, em torno de uma eleição daqui a mais de dois anos, não é positivo para o governo
O presidente Jair Bolsonaro e seu ministro Sergio Moro parecem ter feito apostas erradas, quando um acabara de ser eleito e outro ainda era o juiz da Lava-Jato. Bolsonaro, ao convidar o juiz a ser o responsável pelo atraente combo da pasta da Justiça fortalecida pelo Ministério da Segurança, e Moro, ao aceitar. O presidente ainda não empossado imaginou que usufruiria da popularidade de Moro, sem pagar qualquer preço. E Moro, quete ria em Bol sonar o um apoio firme no enfrentamento da corrupção, numa sequência animadora do seu trabalho como juiz na Lava-Jato. Poderia no Executivo avançar junto com parte do Congresso em reformas para desbloquear o acidenta doca minhoque levará o paí sade fato acabar coma impunidade de criminosos do colarinho branco, no mundo empresarial e no universo político.

O caso do filho de Bolsonaro, senador Flávio, e do amigo dele e da família, Fabrício Queiroz, na administração de uma banca de "rachadinha" montada no gabinete de Flávio ainda no seu mandato de deputado fluminense, mostrou que abandeira anticorrupção do pai era apenas um gesto eleitoreiro. Já presidente, ficou visível como Bolsonaro procurou ajudar o filho e o amigo. Moro criticou o presidente do Supremo, ministro Dias Toffoli, quando ele concedeu liminar pedida pelo advogado de Flávio para suspendera investigação e mandamentos obre ojá senador Bolso narofe ita a partir de relatórios emitidos pelo Coaf, rebatizado de Unidade de Inteligência Financeira (UIF). Foi além e estendeu a decisão a todos os inquéritos semelhantes. Sob críticas da opinião pública e de observações de entidades multilaterais de que o país se arriscava a acobertar lavagem de dinheiro, o exagero foi consertado pelo plenário da Corte. O presidente não gostou da reação do ministro, tampouco quando ele também reclamou da decisão do chefe de, ao sancionar o pacote anticrime, não vetar, como pedira, a emenda teleguiada feita na Câmara para criar o juiz de garantias, uma figura que pode ser positiva, masque agora está a serviço do plano para esvaziara primeira instância da Justiça, de onde o minis trovem. O presidente certamente não contava com um Moro reticente, embora o ministro tenha feito gestos de aquiescência (no excludente de ilicitude, nas armas), e provavelmente não esperava a persistente popularidade do ex-juiz. (...)

Bolsonaro viajou para a Índia ainda na quinta-feira e, ao desembarcar ontem, disse ser "zero" a chance, "no momento", de fazer a separação das duas pastas. "Não sei amanhã, tudo muda". O embate continua. A má repercussão em hostes bolsonaristas apoiadoras da Lava-Jato teria levado ao recuo. Moro espera uma incerta indicação ao Supremo ou rompe e se lança já para 2022? São duas das cartas em cima da mesa. Já numa perspectiva mais ampla, não é bom que o primeiro escalão do governo sirva de espaço de enfrentamento político com vistas a uma eleição para daqui a mais de dois anos.