O Globo, n. 31616, 28/02/2020. Economia, p. 17

Agenda de reformas: em compasso de espera

Manoel Ventura
Geralda Doca
Cássia Almeida


A equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes, decidiu segurar o andamento dos projetos de seu interesse no Congresso, segundo fontes que acompanham de perto as negociações. Diante de um clima político incerto, com a tensão entre o presidente Jair Bolsonaro e o Legislativo nesta semana, a decisão dos articuladores da área econômica foi esperar.

O risco, dizem interlocutores de Guedes, é criar uma insatisfação com as propostas do Ministério da Economia a ponto de inviabilizar de vez sua aprovação. Os técnicos também temem que projetos que aumentam gastos públicos ganhem força no Congresso, nesse contexto de disputa entre Executivo e Legislativo.

Por isso, o entendimento predominante na Economia, nomo mento, é que é melhor espera remedira temperatura exata da Câmara e do Senado na voltado carnaval, na sem anaque vem. E também aguardara votação dos vetos presidenciais a trechos do Orçam entoque desencadearam a crise. Guedes e equipe têm ajudado o Palácio do Planalto a fechar um acordo com os parlamentares nesse tema.

Enquanto isso, a reforma administrativa — que altera regras sobre os novos servidores públicos —, pronta e assinada por Bolsonaro, permanece sem data para ser enviada ao Congresso. A apresentação do texto aos parlamentares vem sendo postergada desde novembro, em meio a resistências de assessores presidenciais e de situações políticas que foram consideradas desfavoráveis para o avanço da proposta.

As demais reformas, que já tramitam na Câmara e no Senado, também tendem a atrasar. São os casos da Proposta de Emenda à Constituição chamada de PEC Emergencial, a que extingue fundos públicos, e a chamada PEC do novo Pacto Federativo.

Retomada do crescimento

A PEC Emergencial corta 25% da jornada e dos salários de servidores públicos como forma de ampliar os gastos federais com investimentos. O Orçamento deste ano, numa alteração feita pelo Congresso, já destina cerca de R$ 6 bilhões para serem gastos após a eventual aprovação da P EC. Já o novo Pacto Federativo aumenta os repasses para estados e municípios, além de alterar regras sobre gasto público.

As reformas propostas pelo Ministério da Economia são consideradas importantes para a retomada sustentável do crescimento, especialmente num momento de incertezas globais causadas pelo avanço do coronavírus. Além de mudanças estruturais para a gestão pública, projetos de interesse da equipe econômica no Congresso tendem a melhorar o ambiente de negócios para a iniciativa privada em setores como saneamento e energia.

A tensão começou como envio de um vídeo de WhatsApp pelo presidente, relacionado a protestos que têm como alvo o Congresso e o Supremo Tribunal Federal (STF), que provocou areação dos Poderes contra o apoio a manifestações que questionam o equilíbrio institucional do país.

Ao mesmo tempo, empresários estão apreensivos em relação à permanência de Guedes no cargo. O ministro, que garante a interlocutores que fica no posto, é considerado pelo mercado um dos fiadores do governo Bolsonaro.

Segundo um empresário próximo a Guedes, o ministro relatou mais de uma vez estar desconfortável com o cenário, com receio de que haja impacto na tramitação das reformas no Parlamento, afetando resultados que ele pretende entregar na economia.

Fontes ligadas ao ministro admitem a existência de fogo amigo no governo e dizem que a disputa em relação ao Orçamento só atrapalha o objetivo maior do ministro: o ajuste fiscal. Contudo, Guedes ainda tem carta branca do presidente e apoio no Congresso. A avaliação é que o discurso do presidente há poucos dias, destacando a permanência de Guedes, seria um recado a integrantes do núcleo duro do governo e do Parlamento.

‘Mercado avalia se evento político atinge reformas’
Entrevista: Tony Volpon, economista-chefe do UBS

Qual o efeito do coronavírus?

Fomos um dos primeiros bancos a diminuir previsão de crescimento este ano em razão do coronavírus, de 2,5% para 2,1%, calculando o impacto só na China. Os efeitos da epidemia na Itália se espalhando para o continente e a confirmação do caso no Brasil ainda precisam ser calculados. Só sabemos a direção.

A direção é de queda?

De queda, sim.

E as tensões entre o presidente Jair Bolsonaro e Congresso?

Está muito difícil diferenciar um efeito (do coronavírus) do outro (político). O momento atual me lembra 2019. Também houve protesto da base política do presidente contra o Congresso. Mas tivemos o almoço com Rodrigo Maia e o presidente, o que nos levou à reforma da Previdência. Não tenho a mínima ideia se vamos trilhar o mesmo final feliz, de sair de um ponto de tensão para entendimento, com a entrega de uma reforma importante e necessária. O mercado avalia se qualquer evento político vai atingir a pauta das reformas. Isso é visto como essencial para trilhar o caminho doloroso e lento da recuperação pósrecessão. Há interesses subjacentes dos envolvidos em fazer a economia crescer. Ninguém se reelege com recessão.

Qual reforma é prioritária?

O teto de gastos (que limita o crescimento das despesas à inflação do ano anterior) não sobrevive nos próximos anos se não forem aprovadas reformas adicionais à da Previdência, para não entrar no pântano jurídico e político se o teto for ultrapassado. São a PEC Emergencial (que prevê gatilhos de redução de gastos com funcionalismo) e a (PEC da) Regra de Ouro (que proíbe endividamento para pagar despesas como salários).