O Estado de S. Paulo, n. 46923, 07/04/2022. Política, p. A10

Terceira via sela compromisso e decide lançar candidato único à Presidência

Vinícius Valfré
Daniel Weterman 


Depois de muitas idas e vindas, o grupo conhecido como terceira via na disputa eleitoral decidiu lançar um único candidato à sucessão do presidente Jair Bolsonaro (PL). Em reunião realizada ontem, em Brasília, dirigentes do MDB, PSDB, União Brasil e Cidadania fecharam uma aliança e anunciaram que vão divulgar o nome de quem representará o grupo na disputa ao Palácio do Planalto no dia 18 de maio.

Até agora, a senadora Simone Tebet (MDB-MS) é a mais cotada para encabeçar a chapa única. O maior problema ocorre nas fileiras do PSDB porque o ex-governador de São Paulo João Doria, vencedor das prévias do partido, está emparedado pela movimentação do correligionário Eduardo Leite. Ex-governador do Rio Grande do Sul, Leite tenta avançar algumas casas no jogo e até admite ser vice em dobradinha com Tebet.

Os dois conversaram ontem no Senado, onde posaram para fotos. Após o encontro, disseram que só uma candidatura única é capaz de furar a polarização entre Bolsonaro e o expresidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), favorito nas pesquisas de intenção de voto.

"O meu partido fez prévias, tem o seu pré-candidato estabelecido. Respeitamos isso, mas não se trata aqui apenas de atender a formalidades e, sim, de ajudar o País a encontrar um caminho", afirmou Leite, que perdeu aquela disputa para o ex-governador de São Paulo.

Tebet mudou um pouco o discurso. Antes de se reunir com o gaúcho, dizia que o vencedor das prévias do PSDB era Doria. "O Eduardo está dizendo que respeita as prévias, mas vem como um soldado. E por trás dele vêm outros soldados", disse ela. "Estou esperançosa."

Embora o nome de Tebet seja cotado para encabeçar a chapa, 13 líderes de diretórios do MDB, principalmente no Nordeste, querem apoiar Lula no 1.º turno. "Qualquer candidatura, para sobreviver, precisará ser competitiva, senão rebaixa os palanques estaduais e se torna desnecessária. O MDB já conhece esse filme", disse o senador Renan Calheiros (MDBAL), um dos líderes do movimento pró-lula no partido.

Negociações. Em um dia marcado por articulações políticas, Doria e o presidenciável do PDT, Ciro Gomes – que também estavam em Brasília –, tiveram uma série de conversas reservadas, em busca de parcerias. Ciro almoçou com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e com seu irmão, o senador Cid Gomes (PDT-CE). Pediu apoio, mas o presidente do PSD, Gilberto Kassab, ainda diz que lançará candidato próprio. Nem o PSD nem o PDT fazem parte do grupo da terceira via, que se autointitula "centro democrático".

Nenhum dos pré-candidatos participou da reunião de cúpula dos partidos. Em comunicado emitido após o acordo, MDB, PSDB, União Brasil e Cidadania destacaram que o objetivo da aliança é apresentar um candidato como alternativa aos polos que atualmente dominam a disputa. "Conclamamos outras forças políticas democráticas para que possam se incorporar a esse projeto em defesa do Brasil e de todos os brasileiros", diz o comunicado. O texto é assinado pelo presidente do União Brasil, Luciano Bivar; do MDB, Baleia Rossi; do PSDB, Bruno Araújo; e do Cidadania, Roberto Freire.

Moro. O União Brasil informou que apresentará um pré-candidato a ser submetido à análise do grupo no próximo dia 14. O ex-juiz Sérgio Moro se filiou recentemente ao União, após sair do Podemos. Presidido pelo deputado Luciano Bivar, o União diz, no entanto, que o projeto para Moro será em São Paulo, provavelmente disputando vaga na Câmara. As divergências de Moro com dirigentes de seu novo partido – principalmente com ACM Neto, que é candidato ao governo da Bahia – ficaram nítidas na semana passada, quando ele afirmou que não será candidato a deputado federal.

O próprio Bivar tem interesse em integrar a chapa presidencial, mas seu nome sempre é citado como vice. Ontem, ele negou que a inclusão de um indicado pelo partido nas próximas conversas sobre candidatura única dificultará a construção de um consenso. "O maior mentor de criar esse consenso fomos nós."

Critérios. Bivar afirmou ainda que a escolha do candidato do grupo levará em conta vários critérios, e não apenas as pesquisas de intenção de voto. "Pesquisas são fotografias de momento. Precisa ver a capilaridade, o Fundo Partidário, a receptividade, a rejeição. Tudo isso vai ser considerado, prevalecendo um sistema de bom senso político", disse ele.

Doria passou o dia em reuniões com deputados e senadores na sede do PSDB, em Brasília, e hoje viajará para a Bahia. Desembarcará em Rio das Contas, terra natal de seu pai, para tentar construir uma nova imagem na campanha, menos elitista e mais popular. As últimas pesquisas indicam que o ex-governador está estacionado num patamar muito baixo, na casa de 2%. É com esse argumento que adversários no PSDB, como o deputado Aécio Neves (MG) e o ex-senador José Aníbal (SP), querem tirá-lo do páreo.

Leite e Tebet também têm índices inexpressivos de intenção de voto, mas, para apoiadores, têm maior potencial de crescimento porque seus porcentuais de rejeição são baixos.

"Com todo respeito, qual é o projeto da Simone (Tebet), do MDB? Onde conflita com o do Ciro e por que não conversamos?", disse Cid Gomes, após o almoço com Pacheco. "Qual é o projeto do União Brasil, que não tem candidato? Tem alguma afinidade com o que Ciro defende ou é só uma negação ao Lula e ao Bolsonaro?"

Coordenador da campanha de Ciro, o senador afirmou que o irmão tem procurado partidos de centro, mas sente falta de propostas concretas por parte da terceira via. "O que nós temos defendido é que, para além da negação do Lula e do Bolsonaro, cada um apresente seu projeto para o Brasil e a gente veja onde é possível negociar. Não dá para ser só o projeto da negação nem só o projeto pessoal", insistiu Cid. •

Movimentação

Em dia marcado por articulações, João Doria e Ciro Gomes também estavam em Brasília