O Globo, n.31.587 , 30/01/2020. País. p.06

Ex-secretário da casa civil ganha novo cargo
Naira Trindade 
Gustavo Maia 


 

Exonerado pelo presidente Jair Bolsonaro do cargo de secretário-executivo da Casa Civil, José Vicente Santini foi nomeado ontem como assessor especial de relacionamento externo da pasta. A decisão foi publicada em edição extra do Diário Oficial da União. Em nota, a pasta informou que Bolsonaro decidiu que Santini “deve seguir colaborando com o governo”.

A nomeação ao novo cargo atende a um apelo do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) e do senador Flávio Bolsonaro (sem partido-RJ), filhos do presidente. Amigo de infância de Santini, Eduardo pediu para que o funcionário fosse mantido em outro cargo dentro do governo. Santini foi demitido por Bolsonaro anteontem após usar um jato da Força Aérea Brasileira (FAB) para uma viagem à Índia, como revelou a coluna de Bela Megale, no GLOBO. Bolsonaro considerou “inadmissível” o uso da aeronave em um voo para apenas três servidores.

— O que ele fez não é ilegal, mas é completamente imoral. Ministros antigos foram de avião comercial, classe econômica. Eu mesmo já viajei no passado, não era presidente, para a Ásia toda de classe econômica — explicou Bolsonaro ao anunciar a demissão.

INVESTIGAÇÃO

Ontem, o subprocurador-geral do Tribunal de Contas da União (TCU), Lucas Furtado, entrou com representação contra Santini para que a a corte apure a viagem. Furtado classificou a o uso da aeronave como um “ato flagrantemente imoral e econômico”. Se for condenado, Santini poder ter que devolver o dinheiro gasto com o deslocamento. Fontes da FAB estimam que o valor chegue a R$ 700 mil.


FAB transportou 14 ministros em voos com até 3 passageiros
Juliana Castro 
Marlen Couto 


 

Um dos motivos para o afastamento de Vicente Santini da Secretaria Executiva da Casa Civil pelo presidente Jair Bolsonaro, o uso de aeronaves da Força Aérea Brasileira (FAB) por até três passageiros ocorreu em outras ocasiões no ano passado. Há casos em que apenas o titular da pasta estava no voo. Levantamento do GLOBO, a partir de registros da FAB de 2019, identificou 72 voos nacionais e oito internacionais, feitos por 14 ministros e três autoridades das Forças Armadas, nos quais havia até três passageiros a bordo.

Bolsonaro criticou a atitude de Santini, que, como interino na Casa Civil durante as férias do titular, Onyx Lorenzoni, usou um jato da FAB para voar até a Índia com dois acompanhantes, onde o presidente tinha agenda oficial. A aliados, o presidente reclamou do uso da aeronave para transportar apenas três passageiros e questionou se o secretário-executivo não poderia ter ido de voo comercial. Regulado por decreto, o deslocamento com aviões da FAB é permitido para ministros, vice-presidente da República, presidentes do Senado, Câmara e do Supremo Tribunal Federal (STF), e comandantes das Forças Armadas, sem restrições quanto ao número de passageiros.

Os registros apontam que, entre os ministros, apenas Ricardo Salles, do Meio Ambiente, fez voos internacionais com até três passageiros. Foram seis trechos. Ele foi sozinho ao Quênia em março, como informou o colunista Lauro Jardim, e voltou ao Brasil em um voo com três passageiros. Salles usou uma aeronave para ir e retornar de Buenos Aires, em maio, e fez uma viagem apenas de ida à capital dos Estados Unidos, ambas com outros dois passageiros. O ministro também retornou sozinho em março de Punta Arenas, no Chile.

Já o comandante da Aeronáutica, Antonio Carlos Moretti-Bermudez, fezviagemde ida e volta a Rionegro, na Colômbia, com outras duas pessoas para participar de uma cerimônia pelos 100 anos da Força Aérea Colombiana.

Já em viagens nacionais, quatro ministros usaram aeronaves da FAB para se deslocarem sozinhos: Salles, Paulo Guedes (Economia), Jorge Antonio de Oliveira Francisco (Secretaria-Geral da Presidência da República) e Marcos Pontes (Ciência e Tecnologia). Em outro caso, o registro identifica o uso do avião como “à disposição do Ministério da Defesa”. Em 23 trechos, os voos da FAB com ministros tinham dois passageiros e, em 44, três pessoas.

O GLOBO procurou o Palácio do Planalto para comentar o levantamento. Não houve, porém, resposta.