O Globo, n.31.588, 31/01/2020. País. p.07

Mortes em rodovias federais voltam a subir
Marlen Couto 


Pela primeira vez em sete anos, o país registrou alta de mortos nas rodovias federais. Em 2019, o crescimento foi de 1,2% frente ao ano anterior, para 5.332 casos, e interrompeu uma tendência de quedas sucessivas observadas nas rodovias entre 2012 e 2018. É o que aponta um levantamento feito pela Confederação Nacional dos Transportes (CNT) com base em dados da Polícia Rodoviária Federal (PRF).

As estatísticas mostram que, em 2019, os acidentes graves, aqueles com vítimas, também subiram. Os registros passaram de 53.963, em 2018, para 55.756 no ano passado. As vias federais tiveram 79.051 feridos, 2.526 a mais na comparação com o ano anterior. Já os acidentes sem vítimas caíram de 15,2 mil para 11,6 mil.

Os casos graves estavam em queda consecutiva desde 2012. A tendência de crescimento dos acidentes com vítimas já havia sido revelada em reportagem do GLOBO de novembro. Especialistas alertam que os casos que registram mortos e feridos costumam ter relação com o excesso de velocidade.

MENOS FISCALIZAÇÃO

No ano passado, o governo do presidente Jair Bolsonaro reduziu a fiscalização de velocidade nas vias federais, sob o argumento de que há uma “indústria da multa” no país. Contratos que garantiam o funcionamento de 2.811 radares fixos (instalados em caráter permanente) nas estradas sob responsabilidade do Departamento Nacional de Trânsito (Dnit), que representam mais de 90% da malha federal, não foram renovados por decisão do presidente. A maioria foi desligada em março.

O GLOBO mostrou que, em setembro do ano passado, havia apenas 439 radares em funcionamento nessas vias. Após a Justiça Federal do Distrito Federal determinar o retorno dos equipamentos, o governo fechou um acordo para instalar 1,14 mil radares fixos.

Entre agosto e dezembro, a PRF também não utilizou radares estáticos (instalado em um suporte ou veículo), móveis (instalado em veículo em movimento) e portáteis (direcionado manualmente) de fiscalização de velocidade por decisão de Bolsonaro.

Na portaria que determinou a suspensão do uso dos equipamentos, o presidente destacou que o objetivo era “evitar o desvirtuamento do caráter pedagógico e a utilização meramente arrendatória dos instrumentos e equipamentos medidores de velocidade”. A fiscalização era feita até então com 299 aparelhos. No fim de dezembro, no entanto, a Justiça Federal do Distrito Federal determinou que a corporação voltasse a usar os radares.

As mortes nas rodovias federais subiram em 13 estados do país. Minas Gerais, que contabilizou o maior número de casos do Brasil, porém, registrou queda de 2% em relação a 2018, de 693 para 677 óbitos. Já os estados que completam o ranking com mais acidentes nas estradas federais tiveram alta de mortes. É o caso do Paraná (1%), da Bahia (4%) e de Santa Catarina (4%). Nas rodovias do Rio, o aumento foi de 28%, de 276 registros para 353.

Os acidentes com vítimas, por sua vez, subiram em 17 estados e no Distrito Federal. A capital federal e cidades satélites registraram o maior crescimento, de 30%, com alta de 690 para 896 mortes no ano passado, seguidas pelos estados de Sergipe (16%) e Rio Grande do Sul (10%).

TENDÊNCIA INTERROMPIDA

Os dados da PRF sobre os acidentes de trânsito nas vias federais indicam que nos primeiros meses do ano passado houve queda de acidentes graves. Os casos passaram a subir a partir de maio.

Rodolfo Rizzotto, do SOS Estradas, defende que a inversão da tendência histórica de redução dos acidentes é explicada pelo afrouxamento da fiscalização. O pesquisador destaca que a média de mortos passou de 398 por mês de janeiro a março, para 449, entre abril e outubro, e 496, em novembro e dezembro.

— Mantida a tendência dos primeiros meses, haveria redução no ano. Não há nenhum estudo técnico que fundamente as medidas que foram tomadas pelo governo federal. O presidente ironizou os especialistas. Estão aí os dados sobre os acidentes para comprovar —critica Rizzotto.