Estado de S. Paulo, n. 46921, 05/04/2022. Economia & Negócios, p. B1

Análise: Lambança

Irany Tereza


A forma tosca como o governo encaminhou a escolha dos nomes para o comando da Petrobras, que resultou na lambança revelada com a desistência dos indicados, leva a duas conclusões:

1) as regras de governança da empresa realmente melhoraram em relação ao que eram até 2016;

2) a incompreensão do controlador (União) sobre as normas internas da companhia prejudica sua imagem e a deixa exposta à intensa especulação de mercado.

Os motivos que levaram Adriano Pires e Rodolfo Landim a abdicar de dois dos mais cobiçados cargos empresariais do País passam longe de um clube de futebol ou dos batidos “motivos pessoais”.

Em reunião marcada para hoje, o Comitê de Pessoas faria a checagem do “background de integridade” dos indicados. Nenhum dos dois passou pelo pente-fino da área de compliance.

Há neste trâmite uma fase formal, com a checagem de dados que possam causar impedimento. Outra, mais informal, é a dos apontamentos. Nela, cada uma das inconformidades é acompanhada da solução apresentada pelo postulante ao cargo. Somente depois disso, o comitê conclui a avaliação, e cada um responde pessoalmente a eventuais processos que questionem a decisão.

Antes da Lei das Estatais e da última mudança estatutária, não havia tantos obstáculos. Congelamentos artificiais de preços de combustíveis ocorreram sem maiores riscos para os administradores.

Há um ano, uma condição do estatuto foi driblada na nomeação de Joaquim Silva e Luna para a presidência. O general não tinha os dez anos de experiência exigidos. Deu-se um jeitinho recorrendo às gestões militares.

Mas, agora, os “apontamentos” foram mais críticos e incluíam o conflito de interesse da CBIE, consultoria de Pires, que atende empresas ligadas de alguma forma à Petrobras, e os processos criminais aos quais responde Landim. Dá para passar por cima? O governo imaginou que sim. Mas teria de ser às claras, colocando na mesa os CPFS dos avaliadores. Quem toparia?

As ações da Petrobras são os títulos mais líquidos da B3 (a Bolsa de Valores brasileira ). Uma rápida olhada no gráfico mostra a mudança de patamar dos papéis neste ano, a partir da elevação da cotação mundial do petróleo acima de US$ 100 o barril.

Os “ruídos” criados pelo controlador refletem as oscilações recentes do papel, que em um mês perdeu 5,82% em valor, apesar da cotação do petróleo.

Enquanto isso, o relógio para a assembleia de acionistas da Petrobras, daqui a 11 dias, continua contando, com a inacreditável ausência de nomes para a presidência executiva e o comando do Conselho Administrativo. 

Colunista do Broadcast