O Globo, n. 31482, 17/10/2019. Opinião, p. 2

A difícil renovação dos quadros partidários



Os dias que transcorrem mostram cenas muito claras que demonstram como o sistema partidário brasileiro precisa evoluir muito, passados 31 anos da promulgação da Carta que institucionalizou a redemocratização.

A desfiliação de quatro deputados do PDT e de três do PSB, por divergências em torno da reforma da Previdência, somada à briga entre os Bolsonaro e o presidente do PSL, Luciano Bivar, expõe de forma nítida algumas causas do distanciamento entre partidos e sociedade.

A saída de jovens parlamentares das legendas, entre os quais se destacam Tabata Amaral (PDT-SP) e Felipe Rigoni (PSB-ES), atesta a existência de barreiras que os caciques partidários erguem à renovação dos quadros, para se perpetuarem no poder, e principalmente continuarem na gestão das centenas de milhões que o contribuinte é forçado a transferir para os fundos partidário e eleitoral.

A alta burocracia partidária alega que os parlamentares desrespeitaram o “fechamento de questão” contra a reforma, e por isso devem ser punidos. Mas a própria decisão de obrigar o voto uniforme costuma ser tomada pelos donos de partido e seus grupos de manobra sem discussões amplas. Marlon Santos (PDT-RS), um dos que se desfiliaram, recorda que o fechamento de questão foi decretado pelo partido de Carlos Lupi antes mesmo de o texto da proposta da reforma ser conhecido, e sem que deputados fossem ouvidos.

O discurso da “democracia interna” ficou em farrapos quando governadores de partidos que se colocaram contra a reforma defenderam o oposto — porque sabem quanto os estados padecem com os déficits previdenciários — , e contra eles não houve retaliação.

Os parlamentares, escorraçados, se desfiliaram espontaneamente e tentarão na Justiça Eleitoral manter o mandato com a alegação de que saem da legenda por “justa causa”. Rigoni, por exemplo, afirma que parlamentares agora penalizados assinaram carta com a legenda (PSB) sobre a “independência programática” do deputado. Foi rasgada.

Os candidatos jovens foram importantes para aumentar as bancadas, e com isso as legendas conseguiram mais dinheiro dos fundos de financiamento de partidos e eleições. Depois do pleito, vale o “centralismo democrático”. Lamentável, porque isso trava a renovação político-partidária.

O conflito entre o clã Bolsonaro e o presidente do PSL, Luciano Bivar, tem permitido que se saiba, por exemplo, que o partido, no Recife, paga aluguel à família Bivar. Um bom negócio que não é explorado apenas no PSL.

Na edição de domingo, o Globo trouxe um dos resultados desse tipo de distorção: em agosto de 2008, os filiados de partdos entre 16 e 24 anos eram 5,2% do total dos militantes registrados; em agosto de 2019, apenas 1,5%.