O Globo, n. 31481, 16/10/2019. País, p. 12

Decreto facilita desvio de armas para milícias, diz MPF

Leandro Prazeres
Marco Grillo


O Ministério Público Federal (MPF) afirma, em uma nota técnica, que o decreto mais recente do presidente Jair Bolsonaro flexibilizando a posse de armas de fogo facilita o desvio de armamentos para milícias. O texto retirou uma série de exigências para que policiais e integrantes das Forças Armadas tenham direito à posse de armas de uso pessoal, entre as quais a comprovação de inexistência de inquérito ou processo criminal.

No documento, assinado pela Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão e pela 7ª Câmara de Coordenação Criminal, o órgão argumenta que, como há agentes de segurança envolvidos com milicianos, a dispensa torna mais fácil o caminho para que armas de uso permitido e restrito sejam usadas pelas organizações criminosas.

“Embora, em princípio, se deva presumir a higidez moral de todos os membros das Forças Armadas e das polícias, não se pode desconhecer que a legislação pátria permite que, durante um bom período de tempo, integrantes dessas instituições sigam na carreira enquanto são investigados em inquéritos policiais ou respondam a processos criminais. Tampouco é possível desconsiderar o fato de que existem policiais e militares investigados e processados em razão de envolvimento com organizações criminosas e milícias”, diz o MPF.

“Agressão ao estatuto”

Segundo os procuradores, mesmo que o número de integrantes das Forças Armadas e de policiais investigados ou processados na esfera criminal não seja elevado, a dispensa automática da obrigação que existia anteriormente é “suficiente para ampliar o risco de transferência de arsenais para a criminalidade, notadamente em cidades como o Rio de Janeiro, na qual há territórios controlados por milícias”.

A nota critica ainda a edição em série de normas flexibilizando o acesso a armas de fogo, o que, para o MPF, “ampliou o cenário de agressão ao Estatuto do Desarmamento e de enfraquecimento da segurança pública”. Os procuradores dizem que, para a polícia, “ficou praticamente impossível discernir o que é autorizado ou não autorizado em termos de posse de armas”. O governo Bolsonaro já editou oito decretos sobre armas de fogo e munições. Desse total, quatro foram revogados.