O Globo, n. 31480, 15/10/2019. País, p. 4

Em pé de guerra

Guilherme Caetano
Daniel Gullino
Henrique Gomes Batista


Em uma escalada da crise que domina o PSL desde a semana passada, o partido deve expulsar os deputados federais Carla Zambelli (SP), Bibo Nunes (RS), Alê Silva (MG) e o deputado estadual Douglas Garcia (SP). Eles são alinhados com o presidente Jair Bolsonaro. O comando da sigla deve se reunir hoje em Brasília para tomar a decisão.

— Já está mais do que justificada (a expulsão) com os ataques irresponsáveis e infundados que fizeram contra o partido —disse o deputado Júnior Bozzella (PSLSP), alçado a porta-voz informal do PSL.

Em entrevista ao GLOBO, Karina Kufa, advogada eleitoral de Bolsonaro, afirmou que pretende judicializar o pedido de auditoria nas contas do partido caso o presidente do PSL, Luciano Bivar, não divulgue os dados. Para ela, a legenda “sempre foi administrada de uma forma coronelista” e teme “abrir a caixa-preta do Bivar” (detalhes na entrevista abaixo).

Na última sexta-feira, Bolsonaro, seu filho Flávio, que é senador, e mais 20 deputados assinaram um documento pedindo a Bivar que abra todas as contas partidárias dos últimos cinco anos.

Saída jurídica

A acusação de falta de transparência pode embasar a desfiliação dos deputados sem perda do mandato por infidelidade. A estratégia foi orientação de Karina e do advogado Admar Gonzaga, ex-ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que também tem aconselhado Bolsonaro.

— Vamos propor um desafio público para a Kufa e o Admar. Já que o presidente é contra o fundo eleitoral e partidário nas campanhas, e os deputados signatários também são, queremos que eles assinem um documento público com valor jurídico abrindo mão do fundo e indo embora do partido. Assim não precisam procurar justa causa e serão todos liberados —disse Bozzella no último domingo.

Os deputados mencionados por Bozzella disseram desconhecer a expulsão, dada como certa nos bastidores da cúpula.

— Oficialmente, até o presente momento, eu não recebi nenhuma informação da executiva do partido — afirmou Douglas Garcia.

Carla Zambelli disse que vai “aguardar para ver os fatos” e que, se a expulsão ocorrer, “estarão no direito deles”. Já Bibo Nunes foi mais firme:

— Se me expulsarem será uma honra.

Bozzella disse que a expulsão dos quatro deputados não é problema, uma vez que outros governadores, deputados e senadores já teriam manifestado interesse em se filiar ao PSL:

— O caso mais público é do governador do Rio, Wilson Witzel (PSC).

O ex-juiz, que foi eleito na onda bolsonarista, está estremecido com Bolsonaro desde que começou a articular a própria candidatura presidencial em 2022.

Um dos signatários do pedido de auditoria no PSL, o líder do governo na Câmara, deputado Major Vitor Hugo (GO), afirmou que o PSL “teria muito provavelmente acabado” sem a filiação de Bolsonaro no ano passado, devido à cláusula de barreira, e cobrou lealdade dos membros da legenda a Bolsonaro.

— O mais importante para quem está desse lado é a manutenção do vínculo e da lealdade com o presidente. O PSL é um partido que teria muito provavelmente acabado se não tivesse dado a legenda para o presidente, por causa da cláusula (de barreira) que foi imposta pela lei. O presidente teve 57 milhões de votos. Havia outros partidos à época que haviam sinalizado para que o presidente pudesse ir para eles —disse Vitor Hugo.

O deputado fez a declaração ao chegar ao Palácio do Planalto para uma reunião com Bolsonaro. Antes de receber o líder, Bolsonaro estava com Karina Kufa e Admar Gonzaga.

O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), afirmou ontem que pode conversar com deputados afastados do PSL. Doria, porém, que já deu abrigo ao deputado Alexandre Frota quando ele foi expulso do PSL por criticar Bolsonaro, defendeu cautela neste momento.

— Nós não vamos avaliar, analisar ou opinar sobre crise de outros partidos. Não é hora ainda de tratar deste assunto. Vamos deixar o PSL serenar e, aí sim, as conversas poderão existir. Eu torço para que tudo corra bem — declarou Doria, após inaugurar a 22ª Edição da Feira Internacional do Transporte Rodoviário de Carga (Fenatran), em São Paulo.

Doria está tentando se descolar de Bolsonaro, a quem declarou apoio no segundo turno da campanha presidencial do ano passado, como parte do projeto para se viabilizar como candidato em 2022. O governador disse que a sigla poderá receber novas deserções do partido do presidente:

— O PSDB é um partido muito aberto àqueles que têm as convicções liberais. Hoje é um partido prómercado, que luta pela desestatização e pelo país. Aqueles que se sentirem bem dentro desta atmosfera liberal serão sempre bem considerados.

“Já está mais do que justificada (a expulsão) com os ataques irresponsáveis e infundados que fizeram contra o  partido” Júnior Bozzella (PSL-SP), deputado

“O PSL é um partido que teria muito provavelmente acabado se não tivesse dado a legenda para o presidente, por causa da cláusula (de _ barreira) ” Major Vitor Hugo (GO), líder do governo na Câmara