O Globo, n. 31480, 15/10/2019. Opinião, p. 2

Fragilidade partidária na crise do PSL



O desentendimento nada cavalheiresco entre a família Bolsonaro e o presidente do PSL, deputado Luciano Bivar, expõe distorções do sistema partidário. No centro do conflito, está a disputa pelos milhões que o nanico PS L passou a recebera o elegera segunda bancada na Câmara, superada apenas pela do PT.

O partido tirou a sorte grande ao ceder legenda ao ex-capitão e, no vácuo da vitória dele, receber R$ 103 milhões do Fundo Partidário, destinados aos diretórios, sob controle de Bivare, no ano que vem, R$ 200 milhões do Fundo Eleitoral, para o pleito municipal.

O presidente da República já disse que“não abre mão” de vetar candidaturas, o que só poderá fazer se tiver acesso ao cofre partidário. Até agora mantido longe do acesso de Jair Bolsonaro por Bivar, cartola de futebol no Nordeste, portanto, acostumado às costuras subterrâneas. Ao GLOBO, afirmou entre risos quenos eu clube, o Sport, do Recife, as decisões mais importante eram tomadas pelos dirigentes no banheiro.

Deputado obscuro, candidato de poucos votos à Presidência da República, Luciano Bivar tem a legislação eleitoral do seu lado, que limita a troca de legenda. Assim, empareda Bolsonaro, que, por ter vencido eleição majoritária, pode trocar mais uma vez de partido sem problema. Mas não sua bancada de deputados, que terá de abrir mão do dinheiro dos fundos.

O virtual financiamento público de campanha, antiga bandeira do PT, terminou referendado pelo Supremo, na esteira dos escândalos envolvendo empreiteiras e políticos desvendados pela Lava-Jato. Vendeu-se a falsa ideia de que estatizar as despesas de partidos e políticos moralizaria este meio. O mau entendimento do problema transferiu para o contribuinte um dispêndio bilionário. Sem que a boa ética purifique a atividade. Os partidos brasileiros têm donos, como as fazendas. Por isso, Bivar afronta um presidente recém-eleito com 57 milhões de votos.

Na eleição suplementar para a prefeitura de Paulínia, São Paulo, já com o presidente eleito, o candidato do PSL, Capitão Cambuí, apoiado por Eduardo Bolsonaro, foi derrotado e deixou dívidas de R$ 200 mil, porque o diretório nacional do partido, sob controle de Luciano Bivar, não liberou os R$ 450 mil que o filho do presidente, deputado federal, e responsável pelo diretório regional, prometera a Cambuí.

Irritado, Jair Bolsonaro afirma com razão: o dinheiro de partidos e candidatos “é público e todo mundo tem que saber o que é feito (com ele).” O ideal é que Bolsonaro defenda esta transparência em qualquer partido que esteja .

A democracia tem mesmo um custo, e a sociedade precisa bancá-lo. Quanto maior o apoio financeiro de filiados e eleitores, melhor. Mas para isso os partidos precisam ser de fato representativos. No Brasil, isso passa, entre outros estágios, pela entrada em vigor na integralidade da cláusula de barreira de 3% dos votos nacionais para as legendas terem bancadas nas casas legislativas, com todas as prerrogativas. Enquanto isso, disputas por dinheiro sempre sobrepujarão os embates de ideias.