O Globo, n. 31509, 13/11/2019. País, p. 12

Em 11 anos, SUS recebeu R$ 33 bilhões do DPVAT
Marlen Couto
João Paulo Saconi
Bruno Góes



Além de afetar indenizações a vítimas de acidentes de trânsito, o fim do seguro obrigatório DPVAT, determinado pelo presidente Jair Bolsonaro por Medida Provisória, terá impacto no Sistema Único de Saúde (SUS) e em programas públicos para educação e prevenção na área. Isso porque a União recebe metade do arrecadado com o seguro, como determina a legislação. Entre 2008 e 2018, foram repassados R$ 33,4 bilhões ao SUS e R$ 3,7 bilhões ao Departamento Nacional de Trânsito (Denatran).

Na Câmara e no Senado, os parlamentares ainda não discutiram o assunto com profundidade. A medida provisória precisa passar por uma comissão mista e depois ser aprovada nas duas Casas para que seja transformada em lei. Presidente da Frente Parlamentar em Defesa do Trânsito Seguro, Hugo Leal (PSD-RJ) criticou a mudança. Para o deputado, o DPVAT é um mecanismo importante para reparar as vítimas de acidentes. Abrir mão da ferramenta, avalia, seria um “erro”.

— É um seguro que cobre 210 milhões de pessoas, todos os brasileiros, seja pedestre ou não. Se há alguma irregularidade, se o governo acha que as seguradoras não estão agindo de forma correta, é possível mexer na alíquota, fazer uma intervenção. Agora, abrir mão de uma receita, também importante para o SUS, acho que é temerário — defende Hugo Leal.

Perfil do auxílio

Em 2018, o DPVAT indenizou 328,1 mil vítimas, entre casos de invalidez permanente, morte e reembolsos de despesas médicas. Dados da seguradora Líder, responsável pelo convênio, apontam que a maior parte das indenizações envolve acidentes com motocicletas (75%), motoristas na faixa dos 18 aos 34 anos (47%) e é destinada a moradores das regiões Nordeste (30%) e Sudeste (29%).

Para Armando de Souza, presidente da Comissão Especial de Direito de Trânsito da OAB, o fim do DPVAT pode causar uma “lesão” aos direitos dos cidadãos. Ele afirma que a medida demonstra que o governo “despreza a proteção às vidas de motoristas, passageiros e pedestres”.

— Esperamos que os parlamentares tenham a sensibilidade de desaprovar a medida provisória assinada pelo governo e percebam a lesão que ela pode causar ao cidadão — defende Souza, que completa: — Estamos retrocedendo cada vez mais na segurança no trânsito.

Sem seguro

Mais uma vez o presidente Jair Bolsonaro usa instrumentos de poder do cargo para fazer retaliação política. É o que se deduz da extinção, a partir de 2020, do DPVAT, o seguro obrigatório para proprietários de veículos no país.

O fim do seguro atinge uma empresa do presidente do PSL, Luciano Bivar, adversário político de Bolsonaro.

A discussão sobre o papel do DPVAT no trânsito no país, um dos mais violentos do mundo, pouco importa.