O Globo, n. 31474, 09/10/2019. Mundo, p. 28

Entidades pedem voto anti-Brasil em conselho da ONU

Filipe Barini


Um grupo de quase 200 entidades brasileiras da sociedade civil lançou ontem um manifesto contra a candidatura do Brasil à reeleição no Conselho de Direitos Humanos da ONU. O texto apresenta fortes críticas à atuação do país nos fóruns internacionais, com ações que, para os signatários, “afrontam a tradição brasileira acumulada há décadas nas relações multilaterais e que sempre caminharam na defesa do universalismo dos direitos humanos.”

O manifesto afirma que as ações do Brasil põem dúvidas sobre a viabilidade de sua candidatura a mais um mandato, alegando que elas “geram retrocessos na efetivação dos direitos”, acusando o governo de ser“anti universalista” e de “glorificar atrocidades”. O documento cita casos como os ataques do presidente Jair Bolsonaro à alta comissária da ONU para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, e os elogios de integrantes do governo à ditadura militar.

“Um governo que atua com sérias reservas, que promove ações que geram retrocessos na efetivação dos direitos e que seja anti universalista não pode querer que a comunidade internacional acredite que tem efetiva disposição paras e comprometer coma realização progressiva, universal, interdependente e indivisível de todos os direitos humanos para todas e todos”, diz o manifesto.

— Essa ação não tem precedente na história do Conselho de Direitos Humanos, até porque essa postura do Brasil, seja de um ataque frontal e coordenado contra os direitos humanos e de uma ação tão nociva do Brasil em Genebra, não tem precedente. É um momento muito particular que estamos vivendo — disse Camila Asano, coordenadora de programas da Conectas Direitos Humanos, uma das signatárias do manifesto.

Para Rogério Sottili , diretor executivo do Instituto Vladimir Herzog, o manifesto é um recado especialmente ao governo brasileiro.

— Essa aderência sem precedentes é um recado para as organizações e movimentos brasileiros, enos diz“não arrefeçam, vocês não estão sozinhos”. Ma sé também um forte recado ao governo brasileiro: o governo que não tiver como princípios norteadores de sua atuação valores básicos de direitos humanos não será aceito nesses espaços.

Itamaraty critica iniciativa

O texto ataca visões de autoridades sobre questões de gênero e indígenas e ameaças sofridaspor nomes de oposição, como o ex-de puta doJean Wyllys (PSOL-RJ). Por fim, avalia que “o Estado brasileiro não reúne as condições mínimas para pleiteara renovação da sua candidatura ao Conselho de Direitos Humanos, considerando os parâmetros da Resolução da Assembleia Geral das Nações Unidas”.

Entre os signatários aparecem organizações de defesa de refugiados, grupos ligados à Igreja Católica, associações de defesa dos direitos da população LGBT+, dos povos indígenas e de vítimas de desastres, representantes do movimento negro e centrais sindicais. Cerca de 40 grupos baseados no exterior apoiam a iniciativa.

Em nota ao Globo, o Itamaraty afirmou que“o governo brasileiro tem compromisso concreto coma defesa dos direitos humanos, tanto no plano interno quanto externo”, garantindo agir de acordo coma Constituição e com as “propostas referendadas pelo povo brasileiro nas eleições de 2018”. Anota ainda considera que a“campanha cont rá riaà eleição brasileira não encontra respaldo no histórico de pluralidade do Conselho de Direitos Humanos”, e diz que ela é uma “campanha politizada, patrocinada por grupos que não manifestam o mesmo grau de ativismo contra o pleito de ditaduras sanguinárias em nosso continente”.

O Conselho de Direitos Humanos da ONU é formado por 47 países , eleitos para mandatos de três anos. O Brasil é um dos três candidatos às duas vagas para a América Latina e Caribe. Até a semana passada, apenas Brasil e Venezuela eram candidatos, com eleição quase certa, mas o cálculos e complicou coma candidatura de última horada Costa Rica. A eleição será no próximo dia 16.