O Estado de S. Paulo, n. 46875, 18/02/2022. Política, p. A10

Aras não vê crime em conduta de presidente

Weslley Galzo


 

O procurador-geral da República, Augusto Aras, pediu ontem ao Supremo Tribunal Federal o arquivamento do inquérito contra o presidente Jair Bolsonaro que apura o vazamento de investigação sigilosa da Polícia Federal sobre um ataque hacker aos sistemas do Tribunal Superior Eleitoral. No documento enviado à Corte, Aras diz não ver crime na conduta do presidente e justifica o pedido com base na "atipicidade das condutas investigadas".

Agora, caberá ao ministro Alexandre de Moraes, relator da ação na Corte, se manifestar sobre o posicionamento da Procuradoria-Geral e definir os rumos do processo.

Bolsonaro se tornou alvo do inquérito em setembro do ano passado, após o TSE aprovar o envio de notícia-crime contra o presidente à Suprema Corte por considerar que ele cometeu crime ao "expandir a narrativa fraudulenta que se estabelece contra o processo eleitoral brasileiro, com objetivo de tumultuá-lo". Dias antes, o presidente havia realizado uma live na qual reproduziu notícias comprovadamente falsas contra o sistema eleitoral e expôs o inquérito sigiloso da PF sobre os ataques ao TSE.

Na avaliação de Aras, no entanto, "a simples aposição de carimbos ou adesivos nos quais se faz referência a suposto sigilo da investigação não é suficiente para caracterizar a tramitação reservada".

Além de Bolsonaro, são investigados o deputado Filipe Barros (PSL-PR) e o delegado da Polícia Federal Victor Neves Feitosa Campos, que também responderá a um pedido de afastamento e a um procedimento disciplinar para apurar o possível repasse de informações sigilosas ao presidente.

A decisão de tornar as autoridades alvo de investigação no Supremo partiu de Moraes, que, na época, não esperou o posicionamento da PGR sobre o caso para agir. O inquérito foi aberto no auge da crise entre o Executivo e as Cortes Superiores do Judiciário envolvendo a campanha bolsonarista pelo voto impresso nas eleições deste ano.

Relatório. No início deste mês, a delegada da PF Denisse Dias Rosas Ribeiro concluiu o inquérito e, em relatório final, apontou crimes do presidente. Segundo a delegada, houve "atuação direta, voluntária e consciente" do presidente no crime de violação de sigilo funcional. A delegada afirmou ainda que o vazamento de informações tinha como propósito alimentar o debate sobre a PEC do voto impresso, rejeitada posteriormente na Câmara.

Para Denisse, a "publicização" do inquérito teve a finalidade de "utilizá-lo como lastro para difusão de informações sabidamente falsas, com repercussões danosas para a administração pública". O documento assinado pela delegada também relacionou a atuação de Bolsonaro e dos demais investigados ao inquérito das milícias digitais, que apura ataques à democracia.