O Globo, n. 31469, 04/10/2019. Opinião, p. 2

Reforma da Previdência não é desprezível



A aprovação, em primeiro turno no Senado, da reforma da Previdência tem importância, mesmo com as desidratações. A insustentabilidade do sistema brasileiro é conhecida há tempos, mas anatural resistência política a atualizá-lo empurrou a primeira grande reforma previdenciária, a atual, para além de um limite aceitável.

Com isso, os gastos com aposentadorias e pensões, em alta constante, já representam mais da metade das despesas primárias da União (excluindo os juros ). Em estados e municípios, asi Os governos FH, Lulae Dilmafizeram alguns ajustes. Pelome nos o problema entrou numa agenda pluripartidária, como aconteceu coma Educação. Mas não se incluiu nas normas a exigência de uma idade mínima para a obtenção do benefício, o que é feito agora. A falha poderia ter sido corrigida há anos, equiparando o Brasil à maioria dos países. Não foi possível.

Na sociedade brasileira é forte aculturada dependência do dinheiro do Estado, que deveria privilegiar os mais necessitados, ma sé disputado por muitas corporações de renda média e alta com influência política. Por isso, o Brasil costuma gastar mais tempo para percorrer o mesmo percurso já vencido por outros países.

Por experiência, não se contava com o R $1,2 trilhão de economia projetada pela equipe econômica para dez anos, a ser permitida pelas mudanças. Em legítimas negociações no Congresso, desidratações ocorreriam pelo caminho. Até esta penúltima votação do projeto —falta ainda o segundo turno na Casa —, o trilhão virou algo entre R $700 bilhões e R $800 bilhões. É uma cifra razoável, ainda mais se comparada com os cerca de R$ 500 bilhões que seriam obtidos pela reforma do governo Michel Temer, depois também de desidratações. A perda de R$ 76,4 bilhões na redução de despesas, ocorrida no final da votação, mostra bem como projetos de alta relevância tramitam pelo Congresso. Os recursos viriam da redução do limite para a concessão do abono salarial.

O governo queria R $988, a Câmara aumento upara R $1.364, e o Senado restabeleceu R$ 1.996. Daí as dezenas de bilhões amais canalizados para uma faixa da população que não é exatamente miserável. Na verdade, os políticos usara meste ponto da reforma para cobrar do Planalto promessas não cumpridas. E a definição formal de quanto os estados receberão do leilão de áreas da cessão onerosa no pré-sal, que foram passadas pela União à Petrobras eque serão agora ofertadas para exploração.

Em tudo isso, ficam mais uma vez explícitos os problemas de falta de coordenação política. O ministro Paulo Guedes está ameaçando tirar da parte dos estados na cessão onerosa os bilhões desidratados. Um erro, porque não se deve partir para o confronto.

E ainda há a PEC paralela, de inclusão dos estados na reforma, que a Câmara continua a ver de maneira enviesada, mas que, com as desidratações, se tornou imprescindível.