O Globo, n. 31467, 02/10/2019. Economia, p. 28

Justiça impede Anac de cobrar dívida de Viracopos

Glauce Cavalcanti


A Justiça Federal suspendeu ontem a cobrança pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) do pagamento de outorgas (taxas pelo direito de operação) já vencidas ou ainda a vencer da Aeroportos do Brasil( AB V ), que administra o aeroporto de Vira copos, em Campinas (SP), até que a agência quite obrigações com a concessionária. A ABV sustenta que o contrato de concessão incluía receber uma grande área adjacente ao aeroporto em terrenos, mas recebeu apenas um quinto do total, o que teria freado projetos e reduzido a receita esperada.

Com dificuldades para pagar dívidas que somam R$ 7,8 bilhões, a concessionária está em recuperação judicial desde 2018. Cerca de 64% das dívidas estão nas mãos da Anac. A medida liminar, assinada pelo juiz João Carlos Mayer Soares, da 17ª Vara da 1ª Região no Distrito Federal, saiu no dia seguinte ao fechamento de um acordo entre ABV,Anace BNDES para tratar de condições para a relicitação do aeroporto. Com isso, a assembleia de credores da ABV marcada para ontem foi adiada para 16 de dezembro. Ações judiciais e processos administrativos existentes entre Anace AB V foram suspensos por 30 dias.

Queda de braço

Na semana passada, a Anac havia sinalizado que poderia pedira caducidade do contrato. Ser iauma retomada forçada do aeroporto, sem pagar indenizações pela interrupção do contrato antes do fim da concessão, que vai até 2042.

Ontem, o juiz assegurou ainda que os valores já pagos por Viracopos em outorgas fixas e que excedem o valor mínimo previsto em edital, de R$ 1,47 bilhão (descontado o ágio), sejam considerados nas taxas não pagas. Na prática, isso pode transformar o que já foi pago em crédito para Viracopos. A Anac informou que não foi notificada e só se manifestaria após analisara liminar.

— O acordo entre Vira copos, Anace BNDES é um ar mistício para caminhar rumo à relicitação. A concessionária não vais e furtara avalia risso, desde que as bases da indenização sejam adequadas —disse uma fonte próxima à gestão da ABV.

— A liminar (de ontem) corrige, de certa forma, uma quebra de contrato que existe desde o início.

Pela regra atual, a concessionária tem de pedira relicitação formalmente e, em 60 dias, encerrara recuperação judicial p araque o processo siga adiante. Vira copos não acha possível fazer isso nesse prazo.

— Não vejo impedimento. É possível antecipar os trâmites para, ao assinar o compromisso, ter 60 dias para cuidar das formalidades para encerrara recuperação—discorda o advogado especializado no setor Miguel Neto.

A ABV é controlada pelo consórcio formado pelas empreiteiras Triunfo e UTC e a operadora francesa Egis. A Infraero, minoritária, tem 49%.

Viracopos foi arrematado em 2012, na segunda rodada de leilão de aeroportos. Em 2017, a concessionária pediu ao governo que aprovasse a devolução do terminal e relicitasse a concessão. Como a União não autorizou, acabou entrando em recuperação judicial. As parcelas de outorga de 2017 a 2019 estão pendentes.

A ABV já apresentou seis pedidos de reequilíbrio econômico-financeiro do contrato à Anac. Dois somavam, em maio de 2018, mais de R$ 5 bilhões em valores reclamados.

— A relicitação é uma questão jurídica. A empresa em recuperação vai tentar tirar o máximo. O governo não vai aceitar revisar contratos porque concorrentes perderam a disputa lá atrás e podem contestar. Ainda poderia levara uma revisão em série de outros contratos —diz Renato Sucupira, consultor da BF Capital.