O Globo, n. 31466, 01/10/2019. Economia, p. 18

Centrais articulam no Congresso reforma sindical, sem governo

Marcello Corrêa
Renata Vieira


Centrais sindicais e confederações patronais decidiram se antecipar aos planos do governo e enviar ao Congresso uma proposta de reforma sindical. As diretrizes do plano foram definidas em reunião entre essas lideranças e o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ). As mudanças devem afetar principalmente as regras que definem quantos sindicatos representam cada categoria. Também está em análise substituir o imposto sindical, extinto pela reforma trabalhista.

Estão sobre a mesa ao menos três planos, segundo o presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT), Ricardo Patah. Um deles mantém a chamada unicidade sindical, que garante que apenas uma entidade negocie em nome de uma categoria de determinada região. A proposta com mais força na equipe econômica prevê que cada empresa possa ter seu próprio sindicato, o que multiplicaria o número de instituições. Essa alternativa é criticada por representantes trabalhistas e patronais, porque poderia dificultar as negociações coletivas.

Uma terceira via é instituir o chamado pluralismo por categoria. Nesse modelo, trabalhadores de um mesmo setor poderiam ser representados por vários sindicatos, mas as entidades seriam nacionais e não municipais, como é hoje. A ideia é inspirada no modelo alemão, onde há de 20 a 30 sindicatos. No Brasil, são mais de 12 mil instituições.

As propostas devem ser enviadas ao Legislativo por meio de proposta de emenda à Constituição (PEC). Segundo Patah, a melhor alternativa, defendida pela UGT, é a que prevê sindicatos nacionais. Ele critica a ideia de permitir que cada empresa tenha um sindicato próprio de trabalhadores.

Número mínimo de filiados

O secretário-geral da Força Sindical, João Carlos Gonçalves, o Juruna, acrescenta que o objetivo das entidades é que as representações sejam, ao menos, municipais. Na avaliação da Força Sindical, a proposta do governo fragmenta e enfraquece a representação dos trabalhadores:

— Isso é interferência na organização sindical.

Segundo Juruna, o plano que permite mais de um sindicato da mesma categoria em uma cidade prevê que a entidade alcance um número mínimo de trabalhadores filiados de representatividade para firmar acordos coletivos. Ainda não há um percentual definido.

O arcabouço deixaria de ser gerido pelo governo federal para responder a uma estrutura bipartite, composta por trabalhadores e empregadores. Essa mesma estrutura ficaria responsável por definir o nível de representatividade dos sindicatos e as taxas a serem pagas.

As centrais pretendem aproveitar o debate para aparar o que consideram arestas deixadas pela reforma trabalhista, aprovada no governo Michel Temer. A nova legislação acabou com imposto sindical, que era obrigatório e financiava os sindicatos. Além disso, determinou que contribuições às entidades sejam autorizadas individualmente pelos trabalhadores — e não em assembleias da categoria. Patah, da UGT, defende que as assembleias sejam autorizadas a criar contribuições. Caso isso não seja permitido, propõe que os acordos sejam válidos apenas para os trabalhadores que contribuem:

—Se em uma assembleia o trabalhador pode resolver se pode dividir as férias em três, diminuir o salário, optar pelo trabalho intermitente, por que não pode decidir quanto vai contribuir para o sindicato?

Se concretizada, a articulação entre centrais sindicais e parlamentares pode atropelar os planos da equipe econômica. No início do mês, o governo criou um Grupo de Altos Estudos do Trabalho (Gaet). Sindicalistas criticam a ausência de representantes dos trabalhadores no colegiado, formado por juristas, acadêmicos e membros do governo.

A Secretaria de Previdência e Trabalho informou, em nota, que o Gaet ouve as centrais e tem reuniões marcadas para os dias 17 e 18 de outubro com representantes dos trabalhadores e das empresas.

Embora o setor produtivo também esteja participando das negociações, as entidades preferiram não se posicionar. Procurada, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) disse que “ainda não existe proposta concreta sobre a qual possa firmar posição”.