Correio Braziliense, n. 21373, 21/09/2021. Política, p. 3

Governador é réu em fraude na compra de respiradores



A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) formou maioria, ontem, para aceitar a denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal (MPF) contra o governador do Amazonas, Wilson Lima, na esteira da Operação Sangria. Com o resultado do julgamento, adiado duas vezes, ele foi colocado no banco dos réus por organização criminosa, embaraço à investigação, dispensa de licitação sem observância das formalidades legais, fraude em licitação e peculato na compra de respiradores para tratar pacientes com covid-19.

Os ministros seguiram o entendimento do relator, Francisco Falcão, que viu elementos suficientes para a abertura de uma ação contra o governador e outras 13 pessoas, entre servidores do estado e empresários envolvidos na contratação, além do vice-governador Carlos Almeida. "Não se trata de meras conjecturas, como alega a defesa de Wilson Lima, mas de indícios da participação do denunciado no acompanhamento do procedimento licitatório que resultou na compra superfaturada, com desvio de recursos públicos. Neste exame não aprofundado da matéria, existe justa causa para se considerar o governador do Amazonas como partícipe nos delitos", salientou o ministro.

O governador do Amazonas foi denunciado em abril como o líder de uma organização criminosa que teria desviado recursos destinados ao enfrentamento da pandemia por meio do direcionamento e superfaturamento de contratos. O estado viveu uma fase crítica no enfrentamento do coronavírus com a crise de desabastecimento de oxigênio hospitalar em Manaus.

Oxigênio
As cenas de desespero em Manaus, em janeiro deste ano, correram o mundo. As pessoas tentavam atender seus parentes, que morriam asfixiados nos leitos dos hospitais, diante do desabastecimento do insumo. A crise chegou a tal ponto, que a Venezuela mandou remessas do gás como ajuda humanitária. A White Martins, fabricante do oxigênio, avisou ao Ministério da Saúde que o desabastecimento era iminente, enquanto o então ministro Eduardo Pazuello comandava uma comitiva que tinha ido à capital amazonense forçar a adoção do "kit covid" prescrito pelo governo federal.

O contrato sob suspeita envolveu a compra de 28 respiradores junto a uma importadora de vinhos, mediante dispensa de licitação e triangulação. Uma empresa fornecedora de equipamentos hospitalares, que já havia sido contratada pelo governo, vendeu os ventiladores à adega por R$ 2,4 milhões. No mesmo dia, a importadora de vinhos revendeu os equipamentos ao Amazonas por R$ 2,9 milhões. Após receber os valores em sua conta, a adega repassou o montante integralmente à organização de saúde servindo, segundo o MPF, apenas como "laranja" para vender os produtos com sobrepreço.

Antes da votação, a subprocuradora-geral da República, Lindôra Araújo, que assina a denúncia, disse que os crimes supostamente cometidos são um "escárnio com a população". "A presente denúncia apresenta-se apta formal e materialmente para ser recebida", defendeu.

Na outra ponta, o advogado Nabor Bulhões, que representa Wilson Lima no caso, disse que não há provas de irregularidades envolvendo o governador e que a atuação da Procuradoria foi "ilegal e abusiva".